O próximo ano será
decisivo para o governo Luiz Inácio Lula da Silva,
porque estes primeiros 12 meses foram de crédito. A
advertência é do presidente do Ibope, Carlos
Augusto Montenegro, sugerindo ênfase muito maior na
área social.
"Os eleitores votaram por mudança. É compreensível
que o primeiro ano tenha sido consumido para arrumar a casa.
Mas agora as pessoas querem crescimento, mais emprego, mais
ações no social".
Por social, explica o mago das pesquisas eleitorais, entenda-se
investimentos em saúde, educação, saneamento
básico, segurança e reforma agrária.
O risco, caso a relação não seja adotada
com fôlego em 2004, será sentido no futuro da
administração Lula.
"Sem mudar, reeleição nem pensar. O governo
Lula precisa encontrar uma marca, uma tatuagem, como o real
e a Lei de Responsabilidade Fiscal foram para Fernando Henrique
Cardoso", alerta.
O símbolo, o ícone da atual gestão precisa
sair da área social. Definida a pauta do segundo ano
de administração -''Reformas não valem,
essa página foi virada'' - e desenhada a tal tatuagem,
o governo Lula terá de vencer, ainda, o problema da
comunicação.
"É preciso saber comunicar. Fernando Henrique
fez muito, mas perdeu-se na hora de contar ao povo suas realizações",
lembra o papa dos levantamentos de opinião pública.
Ah!, também é essencial evitar escorregadelas,
ou ''besteiras'', na definição de Montenegro.
Cita-as: a superexposição dos dissidentes petistas
- ''Não tinham esse peso todo'' -, a discussão
em torno da liberação, ou não, dos produtos
transgênicos, e o recadastramento dos idosos acima de
90 anos de idade, somado às filas quilométricas
para cálculo do reajuste dos benefícios.
"Foram mal trabalhados pelo governo", observa.
Ao contrário do que pensam opositores, é sábio
o presidente Lula quando monta a agenda de viagens, nacionais
e internacionais.
"Ele tem popularidade, e credibilidade, aqui e lá
fora".
Em 2004, contudo, recomenda o comandante do Ibope, deve voar
mais por território brasileiro para manter as esperanças
do povo em alta.
Montenegro está otimista. Acredita que passado o sufoco
do primeiro ano, o governo petista conseguirá surfar
no crescimento significativo em 2004. Acredita que os investidores
externos ficaram sem opções e não têm
''outra saída'' que não endereçar recursos
para Brasil, China e Índia. Afinal, Europa, Estados
Unidos e Japão ''chegaram ao limite''. Com a economia
em ordem e a lição de casa bem cumprida no primeiro
ano, o segundo será de colheita para o governo federal,
avalia.
E, de quebra, ainda vai pegar carona no avanço consistente
da marcha vermelha nas eleições municipais,
em outubro e novembro (segundo turno) do ano que vem.
"O PT somou 185 prefeituras nas eleições
de 2000. Agora, não é miragem imaginar que este
número cresça para algo como mil municípios,
ou um quinto do quadro brasileiro. Isso seria um grande feito".
Não se pense, contudo, que os temas nacionais dominarão
o cenário e serão decisivos nos palanques do
ano que vem. Se, em 2002, a opção foi por alterações
na área social, por humanizar a administração
federal, no próximo o que se vai escolher é
o ''síndico do município'', na definição
de Montenegro. Os 110 milhões de eleitores vão
às urnas conscientes de quais são as atribuições
dos gestores municipais e preocupados, não com os rumos
do país, mas ''com o lixo, a recuperação
da praça, o funcionamento do posto de saúde,
as áreas de lazer''. E, políticos que imaginam
ser a sucessão municipal, o primeiro julgamento da
administração Lula, podem desistir. Se o presidente
correspondeu ou não às expectativas dos mais
de 50 milhões de brasileiros que o levaram ao Palácio
do Planalto isso será revelado apenas nas urnas de
2006.
Se depender do prognóstico do presidente do Ibope,
os prefeitos do Rio, Cesar Maia, e de São Paulo, Marta
Suplicy, já podem começar a comemorar.
"Detesto fazer estas previsões , os políticos
guardam e cobram", brinca.
No melhor estilo Montenegro de ser, contudo, o botafoguense
fanático (ex-presidente do clube carioca) não
pipoca na frente do gol.
"Cesar é um político de primeira, está
fazendo uma ótima gestão e entende muito bem
o papel de síndico da cidade. Marta idem. Faz um tremendo
sucesso com os pobres quando chega toda arrumada de terninho
e salto alto para chafurdar na lama da periferia. Marta está
fazendo um excelente trabalho na educação, deixou
a cidade limpa. É um sucesso".
Não é uma análise aleatória nem
de torcedor. É de quem entende do riscado. Avalia que
o quadro é melhor para Marta que para Maia. No Rio,
relaciona, há concorrentes mais expressivos, como o
senador Marcelo Crivella (PL), a deputada Denise Frossard
(PSDB), o deputado Jorge Bittar (PT), o vice-governador Luiz
Paulo Conde (PMDB). Em São Paulo, uma relação
assim inexiste. O governador tucano Geraldo Alckmin perde
tempo a não definir-se por um nome e o candidato que
poderia fazer frente a Marta, o ex-ministro e atual presidente
do PSDB, José Serra, recusa-se a entrar em campanha.
Paulo Maluf, pensa Montenegro, deve ficar de fora.
Prefeitos interessados na reeleição, que pensam
em inaugurar obras no derradeiro ano de gestão para
faturar votos, podem desistir.
"Eleitor não aceita mais obra de última
hora. Identifica como oportunismo e demagogia", adverte
Montenegro.
Palavras de quem entende do traçado e não joga
avaliações ao léu. Montenegro acompanhou
nos últimos anos as principais eleições
no Brasil. Sem falar que conhece como a palma da mão,
e nas estatísticas, o que o consumidor brasileiro -
perfil médio - gosta ou desgosta. O Ibope pesquisa
para emissoras de televisão o índice de aparelhos
ligados, de telespectadores atentos. Tanto, que o nome do
instituto consta do dicionário Aurélio como
sinônimo de audiência.
"Brasileiro é simples, por isso gosta do estilo
do Lula. É um povo pacífico, otimista".
Ana Maria Tahan e Sônia Araripe,
do Jornal do Brasil.
|