O governo
federal acaba de dificultar uma das suas principais metas
para os próximos dois anos: o fim do trabalho infantil
no País. Portaria publicada no dia 15 acaba com os
Grupos Especiais de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção
ao Adolescente (Gectipa), criados no gestão anterior
nas Delegacias Regionais do Trabalho (DRTs), responsáveis
pela fiscalização em todo o País. Ao
mesmo tempo, na reestruturação de carreira e
gratificações, deixou de fora das metas a serem
cumpridas pelos técnicos as fiscalizações
do trabalho infantil. Os Gectipas, aliados ao Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil, foram responsáveis
por quase 1 milhão de crianças a menos trabalhando
no País desde 1996.
A portaria cria a Gratificação de Incremento
da Fiscalização e da Arrecadação
(Gifa) e estabelece metas para equipes e individuais para
que todos recebam o bônus, de cerca de R$ 2.200 mensais.
Entre elas não há nada relacionado ao trabalho
infantil. Há pontos pelo número de empresas
notificadas, por direito trabalhista regularizado, verificação
de pagamento do FGTS, fiscalização em áreas
rurais e empresas consideradas de risco.
A gratificação é direcionada ao aumento
da fiscalização que traga arrecadação
para o Tesouro Nacional. "O que entrar no Tesouro por
impacto das ações é transformada em gratificação",
explica a secretária de Fiscalização
do Ministério do Trabalho, Ruth Vilela. Ações
sociais, que não trazem esse reforço orçamentário,
ficam de fora, pelo menos por enquanto. "Nada agora é
definitivo. Estamos em uma fase de transição.
Para 2005 estamos fazendo um planejamento, inclusive das metas."
Nos Estados a notícia foi muito mal recebida. Além
do fim dos grupos, em boa parte deles a fiscalização
caiu para segundo plano. Em conversa com fiscais, o Estado
descobriu que os técnicos que atuavam apenas contra
trabalho infantil passaram automaticamente a vistoriar empresas
para poder cumprir as metas do grupo. "A prioridade agora
é nenhuma. É um trabalho de anos, que deu certo,
jogado fora", reclama o ex-coordenador de um dos grupos
que preferiu não se identificar.
Em São Paulo, a ex-chefe do grupo, Marília
Silva, conta que a portaria já trouxe resultados negativos.
Colegas que precisariam passar o dia numa vistoria se sentiram
constrangidos porque não estariam contribuindo para
a meta geral. A idéia do ministério é
que agora o combate ao trabalho infantil passe a ser feito
por todos os fiscais. Como era uma responsabilidade do Gectipa,
os demais se sentiriam desobrigados.
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(Conanda) deve analisar a portaria na próxima reunião,
em novembro. No início deste mês, o ministro
do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, apresentou como
um dos objetivos da pasta não ter mais crianças
com menos de 14 anos trabalhando no País. Hoje, são
cerca de 2 milhões.
LISANDRA PARAGUASSÚ
do O Estado de S. Paulo
|