Com a
função de ir além do entretenimento,
servindo como estímulo para as habilidades sensoriais
e cognitivas das crianças, os brinquedos educativos
superaram também a fama de chatos, caros e pouco diversificados.
Fabricados tanto por pequenos artesãos quando por grandes
empresas, estão mais atraentes, coloridos e variados.
Ganharam espaços nos shoppings centers e espalharam-se
por lojas especializadas.
Para quem pesquisa ou trabalha com o tema, o impulso é
resultado de uma seqüência de fatores: a valorização
da educação infantil, devido a uma conscientização
maior de psicólogos e pedagogos sobre a importância
do período, a percepção dos pais dessa
necessidade e a busca dos fabricantes para oferecer novos
produtos, em resposta à demanda crescente.
Traduzindo em números, cerca de 160 fabricantes, de
pequeno, médio e grande porte, ocupam hoje de 15% a
20% do mercado de brinquedos no país, segundo estimativas
da Associação Brasileira dos Fabricantes de
Brinquedos Educativos e Afins (Abrine). Há cinco anos,
esse percentual estava em torno de 5% a 8%.
"Antigamente existiam butiques de brinquedos educativos,
porque tinha meia dúzia de opções e eram
caríssimos. Isso mudou, mas continuamos com um público
exigente, que nos obriga a pesquisar e procurar novos fornecedores",
afirma Maria Paula Bela de Souza, proprietária da loja
Catavento.
Nas lojas, 5 mil tipos de brinquedos fornecidos por 500 fabricantes
- de artesãos regionais, encontrados durante viagens
por vários Estados, a grandes fabricantes, que editam
livros, CDS e jogos infantis. "Tem mais gente fazendo,
e com uma preocupação maior. Por exemplo, fizemos
uma série de animais da fauna brasileira e fomos pesquisar
com biólogos e veterinários, para fazê-los
parecidos com a realidade e para montar uma ficha sobre cada
um", diz Maria Lemos, da Bichos de Pano.
Para a dona de casa Elizabeth Miranda Costa, esses brinquedos
e jogos são essenciais na educação de
sua filha. "A maioria dos brinquedos que eles vêem
na televisão é muito pronto, não sobra
espaço para a imaginação. Compro essas
bonecas também, mas uma só. E o resto quero
que sejam estimulantes", diz.
Sua filha, Heloisa, de 12 anos, aprova. "Gosto de coisas
difíceis, que a gente fica até conseguir resolver,
acho mais legal. Dou de presente para meus amigos também."
Saber brincar
Mas o cenário não é tão harmônico
e ainda há muitos mitos envolvendo os brinquedos, segundo
os especialistas. O primeiro deles é a idéia
de que comprando o brinquedo e entregando-o à criança,
ela sozinha vai desenvolver suas potencialidades.
"Não há brinquedo auto-educativo. O que
dá força é a intervenção
do pai ou professor, para fazer com que ele cumpra sua função
e seja realmente educativo", afirma o educador Celso
Antunes, autor de vários livros sobre cognição
e inteligência e consultor da Associação
Internacional pelos Direitos da Criança Brincar. Para
explicar isso, o educador recorre a uma comparação:
"Pergunto aos pais se eles conseguem dar ao filho a mesma
atenção que dão quando são chamados
no trabalho para conversar com o chefe. É o mínimo
que devem fazer, mesmo que seja por 15 minutos todos os dias".
O segundo problema está na falta de uma "bula"
desses brinquedos, ou seja, muitos pais diante das opções
não sabem como brincar com as crianças. O terceiro
ponto é o próprio conceito de brinquedo educativo,
geralmente limitado a simples peças de madeira e jogos
de raciocínio.
"Brinquedo educativo é um nome como outro qualquer.
Se o brinquedo interessa à criança, se ele pede
interação, reação, estimula observações,
então ele é educativo. E isso pode ser encontrado
em lojas comerciais, em brinquedos industriais e artesanais,
ou seja, em todos os lugares", diz a pedagoga Nylse Helena
Silva Cunha, presidente da Associação Brasileira
de Brinquedotecas.
Esclarecidos os conceitos, a principal vantagens do aprendizado
associado à brincadeira está no fato de a criança
não se sentir pressionada, cobrada ou com obrigação
de responder a expectativas. "Brincar é essencial
para o desenvolvimento e a aprendizagem. Quando a criança
brinca, ela está aprendendo, se preparando para vivenciar
a realidade e lidar com valores simbólicos e sociais",
diz a pedagoga Edda Bomtempo, professora de psicologia escolar
e de desenvolvimento humano da Universidade de São
Paulo (USP). "E assim ela desenvolve habilidades nem
sempre esperadas, porque ao brincar a criança transforma
a realidade", completa.
Jogo de regras
Na educação infantil, o brincar engatinha,
mas com avanços. A principal modificação,
para os pedagogos, é acabar com a separação
entre hora de brincar e hora de aprender. "Uma criança
deve fazer muitas experiências e o brinquedo é
a ferramenta ideal para isso. É o que ajuda ela a experimentar
o corpo, o tato, o olfato, os movimentos e o raciocínio",
diz a pedagoga Alice Lucot, presidente da Associação
de Brinquedotecas da França, que esteve no Brasil para
um congresso sobre o tema.
"O jogo está começando a ser reconhecido
como um instrumento educativo no mundo inteiro. Com auxílio
de professores, ele alfabetiza a criança sem que ela
perceba que está estudando, ele ensina pensamento matemático
com facilidade. E desenvolve autonomia. Temos muitas pesquisas
que mostram todos esses resultados", diz o pedagogo italiano
Giorgio Bartolucci, especialista em brinquedos e brinquedotecas.
Mesmo com a teoria, a transposição para as
salas de aula às vezes é lenta e complicada.
Depois de uma pesquisa com professores, que constatou a falta
de conhecimento da importância do brinquedo, a pedagoga
Sandra Nascimento iniciou um programa de sensibilização.
"As escolas nos chamam para fazer sessões com
pais e com professores. Levamos uma série de brinquedos
e, ao fazê-los brincar, vamos mostrando o que pode ser
aprendido com eles. No início ficam todos céticos.
Quando termino, não querem mais me devolver os brinquedos."
SIMONE IWASSO
do jornal O Estado de S. Paulo
|