Na mesa
de abertura do último dia de evento, cujo tema foi
"Criando as bases para o desenvolvimento local",
Silvio Caccia Bava, sociólogo e diretor do Instituto
Pólis, apresentou, de forma bastante didática,
os conceitos de "comunidade" e "desenvolvimento",
mostrando como eles se relacionam.
Segundo o palestrante, o termo "comunidade" está
ligado às relações sociais mais próximas
que as pessoas têm (com seus familiares, vizinhos etc).
Assim, a noção de "comunitário"
está sempre identificada com decisões coletivas,
e não com um indivíduo que enfrenta sozinho
os desafios da sociedade.
Mas definir "comunidade", de acordo com Silvio
Caccia Bava, não é suficiente; é preciso
também contextualizá-la. Ele explicou que, no
Brasil, a maioria das comunidades está inserida no
ambiente urbano, já que 82% da população
vive nas cidades. São cidades bastante desiguais, polarizadas,
que concentram a riqueza de um lado e a pobreza de outro.
E nas quais 45% dos habitantes vivem "abaixo da linha
da pobreza", ou com menos de dois dólares por
dia. Caccia Bava afirmou ainda que as cidades latino-americanas
possuem uma estrutura política muito hierarquizada,
autoritária, nas quais as elites controlam a vida pública
- o que é resultado da herança colonial da América
Latina.
O sociólogo partiu de quatro questões para
definir o que é o desenvolvimento: quem o promove?;
quem se beneficia dele?; o que ele oferece para a sociedade
como um todo?; e que lugar ele oferece para os pobres?. Então,
chegou à conclusão de que o Brasil tem um modelo
de desenvolvimento concentrador de riqueza - baseado nas exportações,
que beneficia "os grandes", remete lucros para o
exterior, degrada o ambiente e favorece as desigualdades.
É, portanto, um modelo de desenvolvimento internacional,
imposto pela globalização, que não está
baseado nas particularidades locais e não atende às
suas necessidades.
Caccia Bava afirmou que toda a sociedade brasileira concorda
que o Brasil precisa de um novo modelo de desenvolvimento,
com mais distribuição de capital, redutor das
desigualdades sociais, que beneficie a maioria, gere trabalho
e renda, e preserve o meio ambiente. Mas para inventar esse
novo modelo, é preciso observar, sobretudo, o lugar
que os pobres ocupam na sociedade.
Nesse novo modelo, os pobres devem assumir papel de protagonistas,
organizando-se em entidades e movimentos, garantindo sua participação
nas decisões, exigindo políticas de qualidade
e disputando os espaços públicos. Nesse sentido,
ele citou algumas formas inovadoras de promoção
do desenvolvimento local.
Lembrou, por exemplo, do Grameen Bank, idealizado por Muhammad
Yunus, em Bangladesh. Essa instituição oferece
microcrédito a 75% da população daquele
país, sem exigir nenhum tipo de garantia. No Brasil,
ele contou o caso da "Feira do Produtor", criada
em Santa Catarina, por pequenos agricultores familiares. Como
eles não estavam conseguindo entrar no mercado, com
apoio da Prefeitura, montaram uma feira de produtores, que
vendiam suas mercadorias diretamente aos consumidores, sem
intermediários, e, portanto, a um preço mais
acessível. Foi uma iniciativa da sociedade civil, que
beneficiou toda a comunidade.
Caccia Bava, durante sua exposição, ainda
citou o geógrafo Milton Santos, que dizia que, para
tornar o desenvolvimento local possível, é preciso
"trabalhar as pessoas nas relações com
as coisas". E encontrar a solidariedade, a criatividade
e a lógica presentes na espontaneidade da economia
informal para então inseri-la na programação
dos governos.
O sociólogo disse que o desenvolvimento é
uma construção social, que depende da organização
da população. Por isso, considera fundamental
valorizar as pessoas, as capacidades empreendedoras de todos,
as iniciativas coletivas de geração de trabalho
e renda, a dinâmica particular de cada localidade, a
fim de promover a cidadania, a elaboração de
políticas públicas de qualidade e o desenvolvimento
social.
Para concluir, Silvio Caccia Bava disse que o desenvolvimento
é um projeto político e não econômico.
Assim, ele depende da organização da sociedade
- que inclusive vem crescendo muitos nos últimos cinco
anos; fato comprovado pela dimensão que movimentos
sociais como o dos quilombolas e dos índios assumiram.
Mas ele também depende do apoio dos governos, senão
não ganha a generalidade que necessita. "O desenvolvimento
comunitário é alma de tudo isso, mas ele precisa
ser ampliado", disse. E, para que isso aconteça,
de acordo com o diretor do Instituto Pólis, é
preciso saber votar. Só assim é possível
enfrentar a estrutura hierarquizada e conservadora tão
presente nos municípios brasileiros, alertou.
LAURA GIAMMECCHINI
do site Setor3
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