As economias
do Brasil e da América Latina continuam "fragilizadas",
com taxas de desemprego recordes, crédito para a produção
em níveis mínimos e expostas à possibilidade
de um novo choque externo negativo para toda a região.
Uma "paralisia financeira" na América Latina
poderá travar o crescimento sustentado. Os índices
de pobreza, que haviam diminuído nos anos 90, voltaram
a subir, afetando 225 milhões de pessoas em 2003.
Segundo o "Informe Anual 2003" do BID (Banco Interamericano
de Desenvolvimento), o crescimento de até 4% projetado
para a América Latina neste ano, acima dos 1,5% de
2003, pode não se sustentar a médio prazo.
"As perspectivas de médio prazo são incertas
e a bonança externa não vai durar para sempre.
É preciso aproveitar o momento para consolidar mudanças
estruturais", disse o presidente do BID, Enrique Iglesias,
sobre o relatório, que será apresentado hoje
na abertura da reunião anual do organismo em Lima,
no Peru.
Segundo o BID, todos os problemas latino-americanos continuam
"presentes e preocupantes", apesar da expectativa
de crescimento maior.
Na região, o alto endividamento, as taxas recordes
de desemprego e pobreza e a falta de poupança e crédito
têm sido compensados ""momentaneamente"
por um cenário internacional favorável.
Para o BID, os juros internacionais, hoje em níveis
mínimos, e a forte demanda por matérias-primas
latino-americanas podem ter uma inversão, afetando
a região.
O aumento das exportações foi puxado principalmente
pelo forte crescimento da China. Na média, as vendas
externas do Brasil cresceram 21% em 2003, contribuindo para
uma alta de 19% nas exportações totais do
Mercosul.
O BID vê também uma "paralisia financeira"
na América Latina que pode comprometer o crescimento
a longo prazo.
Nos sete principais países da região, os empréstimos
ao setor produtivo caíram 20% em termos reais entre
1998 e 2003 --levando os investimentos locais ao menor patamar
dos últimos dez anos.
Entre 1997 e 2002, a queda dos investimentos no Brasil atingiu
10%. Na Argentina, 60%.
Questionado sobre como será possível, no caso
brasileiro, inverter esse quadro com os níveis atuais
de juros praticados no país, Iglesias defendeu a cautela
do Banco Central.
"O Brasil está tentando consolidar sua estabilidade
macroeconômica para atingir um crescimento sustentável.
A política de contração brasileira é
transitória", disse.
O relatório do BID recomenda ainda "aperto fiscal"
na maioria dos países para uma diminuição
do nível de endividamento, que atingiu 51% do PIB (Produto
Interno Bruto) em 2002 nas sete maiores economias -contra
uma média de 37% em 1997.
"Os governos que falharem na performance fiscal vão
perder a única oportunidade para se defenderem quando
ocorrer uma nova crise", afirma o BID.
Apesar da situação de "bonança"
descrita pelo relatório em 2003, a América Latina
atingiu no ano passado o maior nível de desemprego
já registrado pelo BID -10,7% em média.
Já a incidência de pobreza (pessoas vivendo
com menos de US$ 2 ao dia) na região atingiu 44% da
população em 2003. A taxa era de 42,1% em 2000.
Dados do Latinobarômetro apresentados no relatório
mostram que o quadro de estagnação elevou a
60% o total de pessoas que consideram "ruim" ou
"muito ruim" a situação econômica
na região.
FERNANDO CANZIAN
da Folha de S.Paulo
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