BRASÍLIA - A aprovação
das duas reformas - tributária e da Previdencia - marcou
o ano de 2003 no Congresso. Em tramitação há
vários anos na Câmara e no Senado, as propostas
foram aprovadas depois de contínuas idas e vindas de
negociações, motivando agradecimentos efusivos
e repetidos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nem só de mega-reformas, contudo, viveu a Câmara
este ano. Desde 17 de fevereiro até 18 de dezembro,
209 proposições foram apreciadas em plenário.
Ao contrário do que se pensa e bem além das
reformas, muitas afetam diretamente a vida dos cidadãos,
como as que tratam da pedofilia, da violência doméstica
e dos hackers.
O crime sexual envolvendo crianças é uma grande
dor de cabeça para as autoridades nacionais. Prática
cada vez mais corriqueira no mundo e no Brasil, torna-se especialmente
grave nas regiões Norte e Nordeste - onde é
comum o chamado turismo sexual. Por isso, os deputados procuraram
formas de apertar o cerco não apenas contra aqueles
que praticam sexo com crianças ou adolescentes, mas
também contra quem abusa delas em produção
de filmes, fotos ou peça teatrais.
Pelo projeto de lei aprovado na Câmara, qualquer um
que utilizar crianças em cenas pornográficas,
de sexo explícito ou em situação vexatória
cumprirá de dois a seis anos de prisão, além
de pagar pesadas multas.
A mesma pena é válida para quem comercializar,
divulgar ou publicar esse material, inclusive pela internet.
Nos dois casos, a pena pode variar de três a oito anos,
se o agente que cometer o crime se valer do cargo ou função
profissional para atrair as vítimas.
Cuidado com as crianças, cuidado com as mulheres.
No embalo do sucesso da novela Mulheres apaixonadas, foi inserido
um novo tipo de crime no Código Penal: a violência
doméstica. Pelo projeto, cuja cerimônia de sanção
presidencial contou com a presença dos atores Helena
Ranaldi e Dan Stulbach - que na novela, representavam as personagens
Raquel e Marcos - a agressão contra a mulher praticada
por pais, filhos, irmãos, maridos ou companheiros com
quem tenha convivido pode levar a prisão por um período
de seis meses a um ano.
O ano que passou também foi pródigo, especialmente
no Rio, no assassinato de policiais. Em São Paulo,
Espírito Santo e Minas Gerais, juízes e integrantes
do Ministério Público (MP) que investigavam
as atividades do crime organizado foram executados na rua,
em plena luz do dia. Projeto aprovado em regime de urgência
na Câmara determinou que o assassinato de juízes,
policiais e membros do MP, no exercício da função
ou em razão dela, tornam-se circunstância agravante
na condenação do assassino e dos mandantes do
homicídio.
Em ano de Matrix reloaded e Matrix revolution, concluindo
a trilogia do escolhido Neo, a vida dos hackers brasileiros
ficou bem mais difícil. Para começo de conversa,
passou a ser considerado crime acessar, indevidamente ou sem
autorização, meio eletrônico ou sistema
informatizado. Com isso, quem entrasse em sistemas empresariais,
bancários ou mesmo de mensagens sem autorização,
estaria cometendo um crime. Na mesma semana em que a lei foi
aprovada na Câmara, a Polícia Federal prendeu
vários hackers que invadiam os sites de bancos e desviavam
dinheiro das contas dos correntistas.
Esse projeto inclui ainda a divulgação de imagens
de pedofilia pela internet e a clonagem de telefones celulares.
As novas penas podem variar de três meses a até
cinco anos, em alguns casos.
Dentro do espírito de preservar os direitos humanos,
os deputados aprovaram ainda um projeto definindo que as instituições
penais destinadas às mulheres devem ter um berçário
para crianças até seis meses de idade e creches
para abrigar as crianças até sete anos. A intenção,
explícita no texto da lei, é ''assistir a criança
desamparada cuja responsável estiver presa''. Resta
saber se essas serão ''leis que pegam'' ou farão
parte do grupo daquelas que nunca entram, de fato, em funcionamento,
como bem lembrou Lula ao sancionar o Estatuto do Desarmamento.
PAULO DE TARSO LYRA
do Jornal do Brasil
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