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As primeiras pedras e ovos começaram a voar ainda
no dia anterior, quando secundaristas e alunas da Faculdade
de Filosofia da USP faziam um pedágio na rua Maria
Antônia para recolher dinheiro para o movimento estudantil.
Mas a "Batalha da Maria Antônia"
estourou mesmo no dia seguinte, 3 de outubro de 1968, uma
sexta-feira. E seu saldo foi trágico: um estudante
secundarista (José Carlos Guimarães, 20) morto
com um tiro na cabeça, três universitários
também baleados e dezenas de feridos.
Além do prédio da Filosofia
invadido e depredado por alunos da vizinha Universidade Mackenzie
e integrantes do CCC (Comando de Caça aos Comunistas),
quebra-quebra, confronto com policiais e diversos automóveis
incendiados.
O artista plástico Cláudio Tozzi, 58, participou
ativamente daqueles dias conturbados, que colocaram a cidade
de São Paulo no clima do que estava ocorrendo no resto
do mundo, sobretudo na França.
"A Maria Antônia era o
nosso Quartier Latin", afirma Tozzi, referindo-se ao
boêmio bairro parisiense que, em maio de 68, viveu verdadeiras
batalhas campais.
A semelhança com Paris não se referia apenas
à contestação violenta. "A região
da Maria Antônia era muito festiva, um ponto de encontro,
uma parte da cidade agradável e animada", diz
Tozzi.
Agradável enquanto as relações
do movimento estudantil ligado à esquerda não
passassem a se estranhar violentamente com os conservadores
do Mackenzie.
"Sempre houve provocação", recorda
Tozzi, como os roubos de urnas da eleição estudantil
de 67. Mas havia também a animação das
passeatas que rapidamente agregavam alunos das escolas próximas.
"Em dois minutos, o que acontecia
na Filosofia já chegava à FAU, onde eu estudava.
Dali para a Administração deEmpresas era um
pulo, e de repente estava todo mundo lá". O ambiente
cultural também florescia, tanto nas escolas quanto
nos bares da região, entre eles o lendário Bar
do Zé, na Maria Antônia com Dr. Vila Nova. Tozzi
foi preso duas vezes, embora não constituísse
uma liderança, como eram o atual ministro José
Dirceu ou Luiz Travassos, da União Nacional dos Estudantes.
Era, sim, um militante, e como tal sentiria a força
do regime militar.
"A primeira prisão foi
coletiva, mais de 60 estudantes, no largo da Concórdia,
em uma ação comandada pelo então famoso
policial Raul Careca. Na segunda, a coisa foi mais séria:
acabei preso pela Oban (órgão de combate aos
opositores do regime) e levado ao Doi-Codi (repartição
do Exército que atuava na repressão)."
Segundo afirma, Tozzi foi submetido
a maus tratos por pelo menos uma semana.
Como seria de se esperar, sua pintura foi fortemente influenciada
pelos acontecimentos da época: "Na verdade, eu
fazia uma espécie de retrato daquilo tudo. Fotografava
e documentava, depois fazia intervenções nas
fotos ampliadas, o que resultava num trabalho afinado com
a realidade. Não era, de jeito nenhum, uma pintura
de cavalete. Buscava uma comunicação mais ampla,
tanto que expunha até em fábricas. Tinha a preocupação
de vincular arte com luta pela liberdade, sob a influência
de tudo o que acontecia no mundo de então e tendo São
Paulo como cenário."
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LUIZ CAVERSAN
Da Folha de S. Paulo
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