A dívida da Prefeitura de São Paulo superou
pelo segundo ano consecutivo o limite estabelecido pela Resolução
nº 40, de 2001, do Senado Federal, e atingiu R$ 26,3
bilhões no final do ano passado.
A informação consta
do Relatório de Gestão Fiscal do terceiro quadrimestre
de 2003, publicado no "Diário Oficial" do
Município de sábado. A dívida, que não
deveria ultrapassar 183,25% da receita, atingiu 246,96%.
A prefeitura atribui o aumento da
dívida à negociação feita com
o governo federal pelo ex-prefeito Celso Pitta, em maio de
2000, e afirma que, apesar de gastar 13% de sua receita para
pagar a dívida, ela não diminui. Esse percentual
significa o pagamento de cerca de R$ 100 milhões por
mês à União.
Juros maiores
A receita com tributos e repasses do Estado e da União
foi de R$ 10,7 bilhões em 2003. Assim, a dívida
não poderia superar R$ 19,5 bilhões. Mas, segundo
o relatório, a prefeitura fechou o ano com uma dívida
de 246,96% da receita (R$ 26,3 bilhões).
Isso significa que, se a prefeitura
direcionasse toda a arrecadação para o pagamento
da dívida, sem gastar nem com salários, ela
somente estaria paga depois de dois anos e meio -sem contar
as as despesas com juros no período.
O acordo homologado pelo Senado prevê
que a dívida seja reduzida gradativamente para 120%
da receita até 2016. Desde o primeiro quadrimestre
de 2002, porém, quando estava em R$ 16,3 milhões,
ela só cresceu. Não apenas em valores, mas também
em percentuais da receita. Desde então, a dívida
também nunca voltou a ficar abaixo do limite estabelecido
pelo Senado.
No ano passado, a dívida teve
uma pequena redução percentual em relação
à receita, no terceiro quadrimestre -passou de 249,36%
para 246,96%. Mas, na apuração final do ano,
o percentual da dívida sobre a receita aumentou -os
valores, também.
No final de 2002, a prefeitura deixou
de pagar uma amortização da dívida com
a União de R$ 3 bilhões, opção
que estava prevista em contrato. Essa atitude, porém,
teve como contrapartida o aumento da taxa de juros, de 6%
para 9% ao ano em 2003.
Isso justifica pelo menos uma parte
do aumento da dívida. A Secretaria Municipal de Finanças
não forneceu dados sobre o crescimento da dívida
em quase R$ 4 bilhões apenas no ano passado.
Responsabilidade fiscal
A Lei de Responsabilidade Fiscal diz que, quando a dívida
fica acima do limite estabelecido pelo Senado em um quadrimestre,
o município deve levá-la novamente para o patamar
máximo em três meses -o que não ocorreu
no caso da prefeitura.
Enquanto estiver acima do limite legal, o município
fica proibido de realizar operação de crédito
e deve obter superávit primário para reduzir
a dívida, promovendo cortes orçamentários.
Se, porém, o prefeito não
fizer os cortes, ele pode ser condenado pelo Tribunal de Contas
do Município a pagar multa de 30% de seu salário
anual.
Já a Lei de Crimes de Prefeitos
prevê pena de detenção de três meses
a três anos para o prefeito que "deixar de ordenar
a redução do montante da dívida consolidada,
nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar
o valor resultante da aplicação do limite máximo
fixado pelo Senado Federal".
Não existe nenhum processo
contra a prefeita Marta Suplicy (PT) por eventual desrespeito
a essas normas legais.
Déficit
O Relatório de Gestão Fiscal aponta a existência
de R$ 562 milhões de "restos a pagar" no
final do terceiro quadrimestre de 2003. Aponta, ainda, um
saldo negativo em conta de R$ 85 milhões.
Isso significa que, em tese, o déficit
anual da prefeitura pode chegar a R$ 647,5 milhões
quando for fechado o balanço de 2003. O valor, porém,
deve ser menor.
Parte dos valores pode se referir a pagamentos que tenham
sido cancelados ou a obras e serviços que não
foram realizados até 31 de dezembro de 2003. Nesses
casos, os valores serão abatidos do resultado final
das contas municipais para a confecção do balanço.
Também pode haver faturas com vencimento em 2004 computadas
nos "restos a pagar".
Na edição de sábado,
a Folha revelou que a prefeitura só pagou no início
de fevereiro algumas obras e serviços realizados para
o município em setembro de 2003.
A Secretaria Municipal de Finanças
confirma a existência de dívidas do ano passado,
mas não informa há quanto tempo os pagamentos
estão atrasados nem quanto somam. Diz apenas que todas
as contas da prefeitura vão estar em dia a partir do
dia 20 de fevereiro.
ROBERTO COSSO
da Folha de S. Paulo
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