Antônio nasceu às
23h05, na sexta-feira passada, e seu primeiro presente foi
uma audição musical. Na luz reduzida, ele recebeu
de sua mãe, Maria Rita, um show particular de melodias
calmas que evocavam animais, estrelas e raios de sol. Não
estavam em um teatro, mas numa sala de parto. À sua
frente, estava o obstetra Cláudio Basbaum, que assistia
a tudo e se lembrava de Elis Regina, avó de Antônio.
Não era apenas a impressionante semelhança da
voz de Maria Rita com a de sua mãe que levava para
aquela sala, no hospital São Luiz, em São Paulo,
as imagens de Elis. "Tinha voltado 28 anos no tempo",
diz Cláudio, um migrante pernambucano que, depois de
formado em medicina em Recife, veio estudar em São
Paulo, onde introduziu o método Leboyer.
Há 28 anos, naquele mesmo hospital, pelas mãos
de Cláudio Basbaum, nasceu
Maria Rita. Elis estava seduzida pelas idéias do médico
francês Leboyer, para quem as crianças deveriam
vir ao mundo sem traumas, quase como se continuassem ainda
no útero materno. "Elis queria ter a filha de
cócoras, como se fosse uma índia. Quase conseguiu."
Existem mais coincidências. Aos sete meses de gravidez,
Elis perambulava pelo Brasil fazendo shows e surgiram sinais
de perigo na gravidez. O obstetra determinou-lhe que parasse
imediatamente de trabalhar. O bebê, advertiu, estava
ameaçado -foi essa mesma advertência que fez
a Maria Rita, que, grávida de sete meses, dava shows
e teria também de parar e ficar em repouso.
Para Cláudio Basbaum, acostumado a fazer partos desde
1960, tudo aquilo parecia um túnel do tempo. Até
pouco tempo atrás, Maria Rita morava em Nova York e
quase ninguém sabia de seus talentos musicais. Ela
não imaginava que poderia virar uma cantora famosa,
não planejava morar no Brasil nem ter um filho. No
passado, dava shows em São Paulo no Supremo, misto
de restaurante com casa de show e confraria de músicos
instrumentais alternativos, espaço onde não
cabem mais de cem pessoas.
Veio tudo de uma vez: sucesso, marido e filho. E ginecologista.
A diferença é que Maria Rita foi mais longe
do que sua mãe na crença do parto suave. Sob
recomendação do médico, repetia algumas
músicas para Antônio ainda alojado em sua barriga
-e cantou as mesmas músicas quando ele nasceu para
que já se sentisse em casa, mesmo estando num hospital.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo , na editoria Cotidiano.
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