Técnicos da Secretaria Municipal
da Saúde foram informados, na segunda, sobre um rastro
de tuberculose que vem contaminando trabalhadores em oficinas
têxteis, a maioria clandestinas, locais sem ventilação,
onde as doenças são facilmente transmissíveis.
Essa contaminação foi descoberta por um indivíduo
que, antes de chegar a São Paulo, aprendeu em Boston,
em Nova York e na Flórida a conviver com doenças
das rotas humanas clandestinas.
O padre Roque Pattussi notou que trabalhadores clandestinos
bolivianos, em geral concentrados no centro de São
Paulo, tinham sinais de tuberculose. "Como iam percorrendo
diferentes oficinas, espalhavam a doença."
Casos desse tipo compõem a rotina do gaúcho
padre Roque, neto de imigrantes italianos. "Sempre ouvi,
em casa, sobre as dores e a solidão dos imigrantes.
Decidi, então, fazer disso minha razão de viver."
Acabou na Flórida, em Boston e em Nova York ajudando
imigrantes brasileiros.
Veio para São Paulo há dois anos. Mudou de clientela,
mas continuou enfrentando problemas, em essência, parecidos.
Comanda a Pastoral do Imigrante e recebe uma romaria de estrangeiros
explorados, doentes ou perseguidos. Dois anos foram mais que
o suficiente para se convencer de que dezenas de milhares
de imigrantes, especialmente bolivianos, vivem em situações
que lembram a escravidão.
"Legalmente, não se pode falar de trabalho escravo,
mas as condições a que são submetidos
esses trabalhadores são semelhantes às dos escravos."
Ele recebe, todas as semanas, denúncias da existência
de imigrantes ilegais obrigados a trabalhar só para
pagar suas dívidas. Para chegar aqui, ganham a passagem
e, depois, um espaço com máquinas. Tudo tem
de ser pago. "Eles ganham R$ 0,40 por peça de
roupa, que depois é vendida por R$ 40 na loja."
Para o padre Roque, a polícia mais atrapalha que ajuda.
"Ela recebe a denúncia e solta alguns, mas, como
não têm para onde ir, eles voltam a trabalhar
clandestinamente. Anistia é a solução."
Os filhos, por não conseguirem freqüentar normalmente
a escola pública, viram mão-de-obra barata;
alguns, sem opção, se entregam ao tráfico
de drogas.
O paulistano não desconfiou ainda de que, no centro,
há pessoas vivendo em condições que se
imagina haver só em fazendas nos recônditos da
Amazônia e do Nordeste. É mais fácil acreditar
que essa situação só exista lá
longe, embora esteja tão perto.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, na editoria Cotidiano.
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