REFLEXÃO


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urbanidade
19/11/2008

O cemitério da fama

No projeto “Milfont”, jovens serão convidados a transformar cemitérios da zona sul da cidade em galerias a céu aberto.

Alberto Milfont Júnior quis ser várias coisas quando era criança e adolescente: jogador de futebol, cantor, violonista e até clown. Vivia repetindo: “Vou ser famoso”. Adulto, desistiu do projeto de celebridade. Não tinha carreira definida e, aos 23 anos, entregava pizza à noite para sobreviver. O assassinato que sofreu dentro das Casas Bahia, no dia 10 deste mês, lhe garantiria apenas uma fugaz publicidade -afinal, não é novidade em seu bairro a morte de jovens.

Mas, na semana passada, começou a ser desenhada uma experiência para oferecer a Alberto Milfont fama eterna. A experiência vai ocorrer justamente no cemitério em que ele está enterrado -dali, a idéia deve se espalhar.

Alberto morava na região do Capão Redondo, conhecida por ter o cemitério (São Luís) com mais jovens enterrados por metro quadrado. O bairro faz parte do chamado “triângulo da morte”. Daí o previsível esquecimento do episódio na loja. Seria mais um corpo a compartilhar aquela métrica fúnebre.

A diferença é que ele atuava, nos finais de semana, como intermediador de conflitos entre crianças e adolescentes que freqüentavam um projeto educacional chamado Casa do Zezinho, na zona sul -a intermediação é uma habilidade desenvolvida em áreas de risco, transformada em currículo escolar em Bogotá, na Colômbia.

Seu trabalho era, portanto, evitar a violência, apartando brigas e promovendo o diálogo. Por isso, o assassinato gerou uma comoção no bairro. Uma comoção, porém, que todos sabiam ser passageira.

Na segunda-feira passada, Dagmar Garroux, criadora da Casa do Zezinho, onde Alberto estudou por muitos anos, conseguiu da prefeitura a autorização para que os muros do cemitério São Luís se transformassem numa galeria a céu aberto -seu projeto já vem há muitos anos ajudando a colorir espaços públicos na zona sul da capital paulista.

Ela obteve a permissão para intervir não apenas no São Luís, mas em todos os cemitérios da região. A idéia é criar um programa de arte, chamando adolescentes de vários bairros, para criar painéis com cores fortes, destacando-se das tonalidades cinzas da região.

A pintura será um pretexto para provocar debates sobre a violência na cidade e como reagir à barbárie no caso, as cores serão uma provocação para ensinar a intermediar conflitos. Pela extensão dos muros, é um projeto para muitos anos.

No mesmo dia em que se obteve a autorização para intervir nos cemitérios da zona sul, o projeto já tinha nome: “Milfont”.

Ainda ligado a temática de arte no cemitério, o internauta Luiz Guilherme Vieira mostra seu trabalho fotográfico, no qual retrata verdadeiras obras de arte instaladas dentro dos cemitérios da cidade de São Paulo. Veja a galeria de imagens.

Coluna originalmente publicada na Folha Online, editoria Pensata.

   
   
 
 

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