Universitários
de BH estão desenvolvendo oficinas com alunos da rede
pública para estimular o aprendizado
Estudantes de dez universidades de
Minas Gerais envolveram-se numa experiência, iniciada
em 2006, para melhorar escolas públicas da periferia
de Belo Horizonte: eles vão descobrir agora que, sem
saber, se transformaram em inventores.
Na quinta-feira passada, durante um seminário em São
Paulo, foi apresentada pela primeira vez a avaliação
do impacto dessa experiência -o estudo foi realizado
nos últimos seis meses por um núcleo de pós-graduação
da Universidade Federal de Minas Gerais. Os alunos das escolas
públicas demonstraram mais interesse pelo aprendizado
e pela leitura, além de ficarem mais disciplinados
e responsáveis. As notas, portanto, são apenas
conseqüência de uma atitude de prazer em conhecer.
Houve mudança até nos hábitos de higiene
e de alimentação.
Por implicar economia de recursos e aumento de eficiência
nas escolas e em suas comunidades, o projeto é útil
aos prefeitos que acabam de ser eleitos e, em suas campanhas,
prometeram melhorar a educação.
Num programa batizado de Escola Integrada, a prefeitura de
Belo Horizonte convidou os universitários, todos devidamente
monitorados por tutores, a desenvolver as mais variadas oficinas
com os alunos das escolas municipais. Tudo deveria ser feito
com um jeito de brincadeira -mesmo o reforço escolar
e as lições de casa deveriam ter um toque lúdico.
O encontro com os universitários não ocorre
dentro da escola (até porque falta espaço),
mas numa praça, numa igreja, num clube ou num parque.
Para administrar essa logística e estabelecer redes,
as escolas criaram a figura do professor comunitário.
O segredo estava não só na ampliação
da jornada, mas na produção dos materiais produzidos
e usados pelos universitários. Eu assisti a algumas
dessas aulas e testemunhei como se usava o cotidiano para
traduzir o currículo -um parque se prestava para as
mais diversas aulas de ciência. Foi bem fácil
para os alunos aprenderem o que era fotossíntese. A
matemática era feita de jogos e até músicas.
O que se está fazendo, na prática, é
criar uma família para cada aluno daquelas escolas
públicas -e aí está a essência
do programa.
Na quinta passada, apresentou-se num encontro promovido pela
Fundação Itaú Social um estudo mostrando
que 70% (vamos repetir, 70%) do desempenho educacional de
uma pessoa depende de sua base familiar, que se traduz em
acesso a livros, cultura, apoio nas lições de
casa, estímulo psicológico, boa alimentação,
saúde etc. Por isso, entre outras coisas, é
complicado comparar escolas públicas e privadas.
As redes operadas pelo professor comunitário com os
serviços públicos (saúde, cultura, assistência
social, lazer e esportes) e o envolvimento diário dos
universitários atuam, na prática, como uma família.
Não é por outro motivo que as crianças
beneficiadas pela pré-escola -a começar da creche-
demonstram vantagens de aprendizado por toda a vida.
Os universitários mineiros estão ajudando a
desenvolver um arranjo educativo local -o que significa, em
poucas palavras, fazer com que as mais diferentes forças
girem em torno do aprendizado.
A novidade desse arranjo, em Belo Horizonte, foi a participação
de universitários dos mais diversos cursos (não
só de educação), orientados por professores,
espalhados em espaços públicos para receber
os alunos.
Em qualquer lugar que se olhe um arranjo educativo -e há
experiências similares em cidades como Apucarana (PR),
Sorocaba, Praia Grande, Taboão da Serra e Barueri (SP)
ou Nova Iguaçu (RJ)-, encontram-se, em diferentes graus,
efeitos positivos.
Nem de longe os problemas estão resolvidos -e, menos
ainda, as notas são satisfatórias. O avanço
está na criação de um ambiente mais propício
ao aprendizado. Mais do que reinventar a escola, o que se
está reinventando é o papel da comunidade, transformada
numa família -está aí a tecnologia desenvolvida
pelos universitários mineiros.
PS: Qualquer governante com um mínimo de responsabilidade
deveria considerar a avaliação da Escola Integração
uma leitura obrigatória -apoiado pela Fundação
Itaú Social, o estudo foi realizado pela Cedeplar,
núcleo de pós-graduação em economia
e demografia da UFMG.
As equipes de pesquisadores ouviram não só os
estudantes mas também seus pais, professores e lideranças
comunitárias.
Coluna originalmente
publicada na Folha Online, editoria Cotidiano.
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