Eles
querem sair viajando por todo o Brasil, levando Bach, Mozart
e Vivaldi para as ruas, no estilo circo mambembe
Ao contrário dos estudantes de música erudita,
Caio Cezar Monteiro Gomes, 20, não tem o projeto de
tocar sua viola numa sala de concertos silenciosa, com acústica
impecável. Optou pela poluição sonora.
"Eu quis levar a música erudita para a rua."
Literalmente. Fez da avenida Paulista seu palco e dos pedestres,
a audiência. E, por enquanto, está conseguindo
sobreviver, à base da bilheteria espontânea.
"Muita gente confunde a bilheteria espontânea com
esmola, mas é uma forma de patrocínio para continuar
oferecendo cultura na rua, a quem jamais ouviria Mozart ou
Bach."
Caio tocava música erudita com mais quatro amigos
em Santos, onde moravam até o ano passado -além
de sua viola, dois violinos, um violoncelo e percussão.
Decidiram subir a serra do Mar e tentar a sorte em São
Paulo. "A imagem que tínhamos da cidade era péssima,
só conflitos, trânsito, violência, gente
estressada." O medo aos poucos foi desaparecendo e eles
descobriram que, por trás de muitos daqueles estressados
e apressados, havia gente disposta a parar alguns minutos
para apreciar o som estranho de um violoncelo.
O quarteto do Concerto de Rua
"Muitas pessoas nunca tinham visto pessoalmente um violino."
A poluição sonora, aos ouvidos deles, era compensada
com o encanto da "platéia" diante do "Concerto
de Rua", o nome do grupo.
Ouça
o Concerto de Rua
A bilheteria espontânea não só dá
para pagar as contas -dividem um pequeno apartamento transformado
em república estudantil- como permite que eles possam
até mesmo contratar professores que os ajudem a se
aprimorar. "Eu até toco de vez em quando numa
orquestra para não perder a prática, mas meu
som está mesmo na calçada."
Mas a calçada também se transformou num escritório.
Eles vêm conseguindo fechar contratos de casamentos,
batizados e festas de confraternização. Tiveram,
então, de adaptar o repertório, encaixando MPB,
especialmente bossa nova, mas sempre com o toque erudito.
Mas o que eles querem mesmo é fazer da avenida Paulista
uma base de lançamento para um projeto mais amplo.
Querem sair viajando por todo o Brasil, levando Bach, Mozart
e Vivaldi para as ruas, no estilo circo mambembe. Torcem para
que, um dia, entre os seus espectadores, apareça um
patrocinador -muitos deles, afinal, trabalham na avenida Paulista.
Enquanto o patrocinador não vem, o "Concerto de
Rua" prepara seu primeiro CD, que, obviamente, será
vendido na rua.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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