A favelização deixou
de ser um problema restrito às metrópoles para
ganhar terreno nos municípios de médio porte
do Brasil -78,3% dos quais já convivem com essa forma
de habitação.
Foi nesse grupo, com população de 100.001 a
500 mil habitantes, que as favelas mais se espalharam em novos
municípios entre 1999 e 2001. Há quatro anos,
139 cidades com esse perfil tinham favelas. Dois anos depois,
já eram 152, com 3.373 aglomerações e
532 mil moradores cadastrados.
Os dados integram a Munic (Pesquisa de Informações
Básicas Municipais), do IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística), divulgada em novembro
e com base em dados de 2001.
Ela também identificou que 17,5% das prefeituras de
cidades médias e 6,2% das grandes (acima de 500 mil
habitantes) declaravam não adotar nenhum tipo de programa
habitacional -e, entre as que tinham alguma atuação
nessa área, ainda prevaleciam as soluções
consideradas mais tradicionais para resolver os problemas
de moradia popular, como a construção de unidades.
Medidas de urbanização de favelas e assentamentos
-defendidos por especialistas desde os anos 90 como uma opção
à construção de casas isoladas em áreas
periféricas- estão na quarta posição
entre as mais frequentes: 56,7% das grandes e 46,9% das médias
cidades as incluíram em suas políticas habitacionais,
enquanto a construção de novas unidades tem
a adesão de 83,3% e 83,1%, respectivamente.
A preocupação com a favelização
nos municípios com até 500 mil habitantes é
notada na prioridade de investimentos do Habitar Brasil BID
(Banco Interamericano de Desenvolvimento), principal programa
do governo federal para a urbanização de favelas:
50 (72,5%) dos 69 projetos em implantação desde
1999 estão nessas regiões, sendo 43 deles naquelas
entre 100.001 e 500 mil habitantes.
Em 2003, segundo informações do Ministério
das Cidades, foram gastos R$ 120 milhões no programa,
lançado ainda na gestão FHC -que investiu R$
62 milhões. Em 2004, serão mais R$ 110 milhões.
A quantidade de famílias que serão beneficiadas
no projeto até 2005 (54 mil), porém, ainda é
pequena em relação à quantidade de domicílios
cadastrados em favelas (2,4 milhões no país,
sendo 1,7 milhão nas maiores cidades).
"Não cobre nem o crescimento vegetativo [de favelados]",
afirma Pedro Taddei Neto, professor da FAU (Faculdade de Arquitetura
e Urbanismo) da USP (Universidade de São Paulo). Ele
diz que a maioria dos municípios não tem hoje
condições de fazer investimentos em habitação.
Defende que a política de construção
de unidades -que requer mais recursos- fique a cargo de Estados
e da União. Às prefeituras caberiam as ações
de urbanização.
A urbanização de favelas consiste na reestruturação
das áreas, com a implantação de redes
de abastecimento, esgoto e energia, abertura e ampliação
de ruas e regularização fundiária, entre
outras melhorias no entorno, para melhorar as condições
de vida desses moradores, recuperando os espaços públicos
e privados.
Entre as vantagens dessa opção habitacional
está a social, ao preservar os relacionamentos já
existentes e organizados entre os moradores, evitando levá-los
para lugares sem nenhuma harmonia com a vizinhança.
Segundo Inês Magalhães, diretora do departamento
de urbanização e assentamentos precários
da Secretaria Nacional da Habitação do Ministério
das Cidades, uma segunda vantagem é a econômica:
sai mais barato do que a construção de novas
unidades (que podem comprometer a renda dos mais pobres) e
não interfere no custo de vida dessa população
(evitando que ela seja deslocada para longe do trabalho e
não consiga nem mesmo bancar as despesas com transporte).
A vantagem urbanística é que, além de
evitar a periferização, a presença de
equipamentos públicos e a regularização
do terreno elevam a auto-estima e a sensação
de segurança desses moradores, que ficam mais dispostos
a investir em melhorias das habitações.
"Mas tudo depende da característica de cada lugar
e de cada favela. A urbanização depende do tipo
de terreno e das condições de risco e de saúde
pública na área", ressalva Sônia
Oliveira, socióloga do IBGE, para quem todos os programas
habitacionais citados pelas prefeituras na pesquisa "têm
sua devida importância".
Taddei Neto diz temer que a urbanização de
assentamentos seja encarada pelos governos apenas como um
investimento em infra-estrutura. Para ele, "é
indispensável" ela ser acompanhada da reconstrução
das unidades. "Para fazer uma habitação
onde haja um espaço para a intimidade do casal, por
exemplo", afirma.
Inês Magalhães diz que a urbanização
muitas vezes precisa ser acompanhada de algumas remoções,
principalmente quando há um adensamento das moradias.
A secretária-executiva do Ministério das Cidades,
Ermínia Maricato, aponta que um dos problemas enfrentados
nas regiões que receberam urbanização
é a falta de manutenção do poder público.
Maricato, que em 2000 participou de um estudo realizado pelo
LabHab (Laboratório de Habitação da USP)
em oito favelas de cinco municípios (São Paulo,
Rio de Janeiro, Fortaleza, Goiânia e Diadema), afirmou
que é comum a prefeitura realizar obras, mas abandonar
a área depois.
"Nos bairros, há a necessidade contínua
de manutenção, como podas, remoção
de lixo, tapa-buracos. Na favela, a prefeitura não
mantém esses serviços."
As informações são
da Folha de S. Paulo.
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