Organizações do movimento
negro brasileiro lançam em novembro uma campanha nacional
para facilitar o acesso de negros à escola, ao trabalho
e à cultura.
Intitulada "Ação Afirmativa, Atitude Positiva",
a campanha tem como símbolo a camélia, flor
usada pelos abolicionistas brasileiros durante a campanha
pelo fim da escravatura (1888).
Ações afirmativas podem
ser definidas como políticas públicas e privadas
criadas para combater a discriminação -seja
racial, de gênero ou de origem- ou para corrigir efeitos
de uma discriminação ocorrida no passado.
Surgiram nos Estados Unidos, mas são
hoje aplicadas em vários países do mundo, inclusive
no Brasil. A reserva de vagas de candidatos para mulheres
é um exemplo de ação afirmativa.
A campanha da camélia vai instituir
um selo de qualidade -com o desenho da flor- para ser oferecido
a empresas, pessoas e escolas que praticarem a ação
afirmativa. Será lançada uma linha de produtos
com o símbolo.
Em paralelo, um balcão de empregos
encaminhará profissionais negros ao mercado. A campanha
quer ampliar a participação de negros em novelas
e comerciais, organizando uma marcha a Brasília em
defesa de ações afirmativas.
A camélia branca, oferecida
por uma mão negra no cartaz da campanha, é uma
forma de tentar vencer a imagem de intransigência associada
a projetos do tipo -como a cota, com reserva de vagas para
negros em universidades públicas.
Numa inversão da tática
de 2001, quando o movimento negro apontou num shopping center
do Rio lojas que não contratavam negros, o objetivo
é destacar positivamente pessoas e empresas que fizerem
ação afirmativa.
"Ninguém assume que discrimina.
Todo mundo apóia a ação afirmativa, mas
não pratica. Se ninguém é contra, então
vamos praticar", diz Ivanir dos Santos, do Centro de
Articulação de Populações Marginalizadas,
um dos coordenadores da campanha.
Financiado pela Fundação Ford, o projeto tem
a participação de outras entidades, como a Educafro
(que realiza cursinhos pré-vestibulares para negros),
o IPDH (Instituto Palmares de Direitos Humanos) e o Olodum.
A idéia de usar a flor surgiu
a partir do livro "As Camélias do Leblon e a Abolição
da Escravatura", do historiador Eduardo Silva, pesquisador
da Fundação Casa de Rui Barbosa e doutor pela
Universidade de Londres.
No livro, editado pela Companhia das
Letras, Silva relata como camélias produzidas num quilombo
do Leblon (zona sul do Rio) se transformaram em símbolo
dos abolicionistas radicais, que defendiam a libertação
incondicional dos escravos.
"Quando eles perguntaram se podiam usar a camélia
como símbolo, eu disse que ela não pertence
a mim, mas à história do Brasil", afirmou
Silva.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística), a taxa de analfabetismo
dos identificados como pretos era 18,7% em 2001, enquanto
a dos brancos era 7,7%. O rendimento médio dos brancos
era o dobro do de pretos e pardos. Em 2001, pretos e pardos
eram 46% da população.
FERNANDA DA ESCÓSSIA
Da Folha de S. Paulo, sucursal do Rio
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