O dia de Osvaldo Marcílio,
mensageiro do Sindicato dos Comerciários de São
Paulo, começa às 5h30. É a hora que ele
sai da cama para se preparar para mais um dia de trabalho.
De sua casa, no Cambuci, até o Centro, local do escritório,
leva cerca de meia hora de ônibus. Às 8h, já
está no 4º andar do prédio da Rua Formosa,
367, pronto para as tarefas do dia: ir ao banco, entregar
correspondência e retirar material. A jornada de trabalho
é de oito horas, com uma hora de almoço.
Até aí, nenhuma novidade. Certo? Nem tanto.
O office-boy Osvaldo tem 66 anos. Ele é um dos 400
mil aposentados da Região Metropolitana de São
Paulo que voltaram para o mercado de trabalho. De acordo com
a pesquisa de Emprego e Desemprego da Fundação
Seade e do Dieese, os inativos representam hoje 5% do total
de ocupados da Região Metropolitana, que é 7,8
milhões de pessoas.
No Estado de São Paulo, a situação é
semelhante. Pelos dados do Censo de 2000 do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), São Paulo
tem 3.195.304 aposentados, grande parte deles idosos. Desses,
725.285 têm alguma ocupação, ou seja,
2,3% possuem outra fonte de renda (por motivo de trabalho)
além do benefício pago pela Previdência
Social.
Renda achatada
Paula Montagner, gerente de análise do Seade, explica
que esse fenômeno tem pelo menos duas explicações.
A primeira delas é o ingresso precoce na atividade
profissional. Há 30 anos, era comum, principalmente
entre os homens, ingressar no mercado de trabalho jovem, com
idade entre 12 e 15 anos, e já com registro em carteira.
Como a contribuição ao INSS começava
cedo, a aposentadoria também chegava cedo para essas
pessoas.
A segunda, e muito mais grave, é a queda no rendimento.
Com os benefícios achatados — de acordo com o
próprio INSS, a aposentadoria média no Estado
de São Paulo é de R$ 640,27 —, muitos
se vêem obrigados a retornar ao batente, na tentativa
de manter o mesmo padrão de vida que tinham na época
da ativa. “Ao se aposentar, as pessoas perdem poder
de consumo. Efetivamente temos um problema de renda”,
reforça Paula.
Foi justamente isso que mostrou o estudo “O idoso brasileiro
no mercado de trabalho”, publicado em 2001 pelo Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Com base nos
dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD), os pesquisadores constataram que, em 1998, o trabalho
representava 57% da renda do aposentados. No caso das mulheres,
esse número é menor, 46%, mas nem por isso menos
significativo. Isso mostra a importância dessa renda
extra, principalmente no orçamento familiar, já
que os idosos contribuem com cerca de 53% da renda de sua
família.
Contas versus benefício
O caso de Osvaldo é exemplar. Ex-comerciário,
aposentado desde 1985, ele recebe benefício de R$ 350.
Apesar de morar em apartamento próprio, as despesas
com água, luz, telefone, gás, condomínio
e remédios consomem mais que o dinheiro que recebe.
A saída foi arrumar outro emprego. No sindicato, seu
salário é de R$ 950, quase o triplo do que recebe
pela Previdência Social. “Nesses 19 anos que estou
aposentado, nunca deixei de trabalhar. Aquele sonho de trabalhar
a vida inteira e descansar na aposentadoria não existe.
Como diz o ditado italiano, a velhice é bruta”,
lamentou o office-boy ao comentar a dura realidade de sua
vida e do que recebe do INSS.
Bruta, principalmente, porque a disposição
para o trabalho não é mais a mesma. Com problemas
de pressão alta, arritmia cardíaca e artrose,
Osvaldo toma medicação de uso contínuo
e mesmo assim precisa driblar as dores para trabalhar. “Em
virtude da artrose, sinto dores no joelho quando ando demais.
Mas é preciso agüentar forte. Infelizmente, não
tenho outra saída”, explica, ressaltando que
além das despesas de casa, ainda faz questão
de ajudar a neta Samanta, que passa uma temporada de estudos
em Belo Horizonte, Minas Gerais.
Mas reclamar não é uma de suas atividades preferidas.
Apesar de todos os problemas, ele agradece a Deus tudo o que
já viveu nesses 66 anos.
PAULA ALFACE
Diário de S. Paulo
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