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Você
sabe o que é tecnologia social? É, segundo os
especialistas, “o conjunto de técnicas e processos
associados a formas de organização coletiva
e estratégias de desenvolvimento capazes de produzir
soluções que podem ser reaplicadas, em escala,
e que contribuam para a inclusão social e melhoria
da qualidade de vida". Não entendeu ainda? Em
outras palavras: tecnologias sociais são as técnicas
utilizadas em projetos bem sucedidos de ação
social. Na verdade, ainda não existe um conceito fechado
para esta expressão e, por isso, a Fundação
Banco do Brasil (FBB) em parceria com a Petrobras, a Secretária
de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica
(SECOM), o Ministério da Ciência e Tecnologia
(MCT), o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas (SEBRAE), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep)
e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA)
promove a I Conferência Internacional de Tecnologia
Social, de 17 a 20 de novembro, no Palácio das Convenções
do Anhembi, em São Paulo. O encontro, voltado exclusivamente
para o assunto, será durante a Brasiltec, feira de
tecnologia realizada anualmente na capital paulista.
Além de firmar e aprofundar o conceito de tecnologia
social, estudiosos pretendem abrir uma discussão nacional
sobre as formas de sua aplicação e difusão.
“Tecnologia Social é tudo aquilo que resolve
algum problema social. Isto é, a demanda por alimentos,
água, educação, trabalho, cultura, entre
outras coisas. E, por ser simples, ela pode ser reaplicada
em diferentes lugares”, explica Luiz Fumio Iwata, diretor
de Tecnologia Social e Cultura da FBB e também um dos
coordenadores da Conferência.
Segundo Iwata, um bom exemplo para entendermos o que é
tecnologia social é o projeto de agricultura familiar
sustentável desenvolvido e aplicado pela Agência
Mandalla de Desenvolvimento Holístico Sistêmico
Ambiental, sediada em João Pessoa, na Paraíba.
Lá cada família divide seu terreno em nove faixas
circulares de plantação com um reservatório
de água no centro – são as mandalas. Nos
três primeiros círculos são plantados
alimentos que garantirão a subsistência da família.
Nos cinco seguintes, os que serão comercializados e
no último, são plantadas árvores de grande
porte que vão proteger as outras plantas de fatores
externos e ainda servirem de alimentação para
os bichos. O Projeto Mandala e outras 212 tecnologias sociais
estão cadastradas no Banco de Tecnologias Sociais da
FBB www.tecnologiasocial.org.br, um repositório criado
em 2001, com o apoio da UNESCO, que reúne os projetos
certificados pela Fundação em cerimônia
realizada de dois em dois anos. A próxima edição
será no próximo ano e durante a Brasiltec o
estande da FBB estará fornecendo mais informações
sobre o Sistema Mandalla e outras 14 tecnologias cadastradas
na FBB.
Mahatma Ghandi: o pioneiro
Para explicar os efeitos e a abrangência das
tecnologias sociais, o pesquisador e professor titular do
departamento de política científica e tecnológica
da Unicamp, Renato Dagnino, fará a palestra Tecnologia
Social: Conceituação, sobre a origem da expressão,
que se surgiu do termo tecnologia apropriada, usado pela primeira
vez no final do século 19. Dagnino conta que a primeira
experiência do que viria a se chamar tecnologia social
foi realizada na Índia, pelas mãos do líder
pacifista Mahatma Ghandi.
“Os pensamentos dos reformadores daquela sociedade estavam
voltados para a reabilitação e o desenvolvimento
das tecnologias tradicionais, praticadas nas suas aldeias,
como estratégia de luta contra o domínio britânico.
Entre 1924, Gandhi começou a construir programas visando
à popularização da fiação
manual realizada em uma roca de fiar reconhecida como o primeiro
equipamento tecnologicamente apropriado, a Charkha. Era uma
forma de eles lutarem contra o sistema de castas que perpetuava
a injustiça social na Índia”, conta o
professor.
De lá para cá, muitas expressões surgiram:
tecnologia alternativa, tecnologia utópica, tecnologia
intermediária, tecnologia correta, tecnologia ecológica,
tecnologia limpa, não-violenta, humana, de auto-ajuda,
democrática, de vila, libertária, entre outras.
Todas com uma proposta em comum, a de serem alternativas à
tecnologia convencional, que, segundo os estudiosos, não
tem sido eficaz na solução dos problemas sociais
e ambientais. Em 2000 chegou-se ao termo Tecnologia Social,
como explica Renato Dagnino: “Havia muitas expressões
para designar a mesma coisa. Em 1999, optei por usar em meus
textos o termo Inclusão Social. Em 2000, os pesquisadores
começaram a usar tecnologia social como uma alternativa
para abreviar tecnologia para a inclusão social. Desde
então, a expressão se tornou uma marca registrada”.
Hoje, em vez de se prender ao debate sobre o conceito de tecnologia
social, os
estudiosos têm preferido ir direto às formas
de difusão das tecnologias. E este será o objetivo
da conferência. “Os problemas sociais do Brasil
estão em escala de milhões – são
milhões de analfabetos, outros milhões de desempregados
- e as tecnologias sociais atendem a dezenas, centenas de
pessoas. Vamos discutir na Conferência como ampliar
a área de atuação das tecnologias sociais”,
avalia Iwata.
Uma rede nacional
Uma das estratégias mais eficazes para a difusão
das tecnologias seria a criação de uma Rede
de Tecnologia Social (RTS), interligando bancos de dados de
diferentes organizações. Através da rede
- um dos debates da conferência - as instituições
cadastradas poderiam apoiar ou viabilizar o desenvolvimento
de qualquer tecnologia social, mesmo as que sejam do banco
de dados de outra instituição. Projeto semelhante
ao desenvolvido pelo indiano Anil K. Gupta, que vem ao Brasil
para a conferência explicar o mecanismo de sua Honey
Bee Network (Rede Mel de Abelhas, em inglês), que montou
uma rede pela internet para disseminar suas idéias
e a de seus colaboradores.
O professor de Pós-Graduação em Economia
e Administração da PUC de São Paulo Ladislau
Dowbor explica que as tecnologias sociais ainda não
transformaram os números das estatísticas nacionais,
mas por outro lado vem beneficiando a economia de pequenos
municípios. “Hoje vejo muitas pessoas arregaçando
as mangas para criar iniciativas que vão desde a construção
de casas até projetos mais elaborados de aproveitamento
de recursos que são subutilizados. Nós, estudiosos
em tecnologias, ficamos muito focados nos índices publicados
pelos centros de pesquisa e não olhamos para a riqueza
de milhares de iniciativas locais que estão sendo desenvolvidas
no Brasil. Mesmo diversificadas, elas vêm ajudando a
aquecer a economia de casa município.”
A inscrição para a I Conferência Internacional
de Tecnologia Social é gratuita e pode ser feita pelo
site www.brasiltec.com.br . Os organizadores aguardam cerca
de 400 participantes.
DANIELLE CHEVRAND
da Fundação Banco do Brasil
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