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Entorpecentes
22/11/2004
Mulher no crack, cada vez mais

Se o viciado em crack, o nóia, está no nível mais baixo da escala de tipos humanos, a viciada na droga fica ainda mais abaixo. Só que, cada vez mais, há mulheres dependentes de crack.

Para conhecer e trazer à tona o universo feminino do crack, a psicobióloga Solange Nappo, do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas psicotrópicas (Cebrid) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), coordenou uma equipe que entrevistou 75 mulheres em São Paulo e São José do Rio Preto, com mais de 14 anos, todas viciadas na droga.

Os depoimentos trouxeram importantes novidades para os pesquisadores. A principal: o total de mulheres dependentes da droga está crescendo dentro dos grupos de viciados. As mulheres também estão se destacando como as principais provedoras de crack para os companheiros do grupo. Em vez de roubar e se arriscar fisicamente para obter dinheiro para o consumo, elas podem faturar se prostituindo.
Tanto com clientes ou diretamente para traficantes, trocando o corpo pela pedra. A prostituição parece vantajosa, porque permite uma renda constante sem tantos atritos com a polícia.

Os pesquisadores afirmam que, com essa transformação, resultados sociais relevantes aparecem. Os problemas ligados ao crack tendem a ficar mais restritos a um submundo que se fecha em si mesmo. O vício dos homens se faz notar mais facilmente porque eles roubam ou assaltam.

As mulheres, ao contrário, nem mesmo pelo medo conseguem se impor ou se fazer notar. Mantêm-se submissas e passivas para obter dinheiro da droga e não forçam ninguém a nada. Precisam apenas aceitar convites dos homens que as pagam. Se afundam e se destroem, aparentemente sem atrapalhar ninguém.

"As mulheres viciadas são um problema social invisível, porque ele não atinge os outros", diz Solange. "Como afetam apenas a si mesmas, a existência delas no mundo não parece fazer nenhuma diferença."

Com o estudo, os pesquisadores procuram dar visibilidade ao tema e alertar que existem riscos sociais que podem afetar a todos, relacionados principalmente à propagação de doenças sexualmente transmissíveis, especialmente a aids.

Algumas entrevistadas, por exemplo, dizem fazer até nove programas diários. E boa parte não usa preservativos. A maioria já sofreu algum tipo de violência do cliente. "O drama é ainda maior porque, quando estão sob efeito da droga, elas costumam se expor e não se previnem", diz Solange. "Quando vemos e compreendemos o problema, fica mais fácil resolvê-lo."

Criptonita
Se os problemas ligados ao vício diferem conforme o sexo, os efeitos físicos do crack são iguais. Entre os consumidores de crack, a pedra recebe o apelido de criptonita, nome de uma rocha espacial que nos episódios do Super-Homem é a única capaz de destruí-lo e de sugar suas forças. A droga surgiu nos Estados Unidos em meados dos anos 80 e chegou a São Paulo no fim da década, popularizando-se nos anos 90. É feita da pasta de cocaína, adicionada a bicarbonato de sódio. Aquecida, é consumida em cachimbos.

Para ampliar mercado, segundo relatos de antigos dependentes, os traficantes de época passaram a segurar a venda da cocaína para empurrar o crack. A droga traz sensação ao liberar a dopamina - excitante mais poderoso do organismo. As substâncias contidas na fumaça do crack são absorvidas rapidamente pelo cérebro por causa dos inúmeros vasos sanguíneos espalhados pelo pulmão, em uma área 200 vezes maior do que a da mucosa nasal, usada para consumir cocaína.

Quando a pedra acaba, vem a chamada fissura. A falta de dopamina no cérebro provoca forte depressão, chamada de paranóia, que pode se transformar em um pesadelo de alucinação e medo.

Para se livrar da fissura e da nóia, é preciso fumar novamente. O alívio é temporário e o ciclo se reinicia. A vida, então, passa a se resumir a este eterno movimento circular.


BRUNO PAES MANSO
do jornal O Estado de S. Paulo

   
 
 
 

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