Está nas mãos do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) autorizar ou não a potencial destruição
de importantes remanescentes florestais em áreas urbanas.
Responsáveis pela preservação de fontes
de água e da biodiversidade, contenção
de encostas e manutenção do bem-estar para os
moradores das cidades, as árvores poderão dar
lugar a empreendimentos imobiliários se for sancionado
na íntegra o projeto de lei 47/2004, aprovado no início
do mês pelo Congresso Nacional.
O artigo 64 da proposta diz que o Código Florestal
(de 1965, atualizado em 1989) deixa de ser aplicável
a áreas urbanas ou de expansão urbana se elas
forem usadas para parcelamento do solo em lotes ou construção
de imóveis.
Na prática, isso quer dizer que as prefeitura poderão,
via decreto, autorizar o desmatamento em locais antes protegidos
por suas funções ambientais ou até mesmo
pela sua beleza natural.
Como transformar trechos do território em áreas
urbanas é interessante financeiramente para os municípios
--eles passam com isso a arrecadar IPTU (Imposto Predial e
Territorial Urbano) dos imóveis nesses locais--, o
projeto de lei une a fome arrecadatória das prefeituras
com a vontade de comer lucros da construção
civil. A avaliação é de dezenas de entidades
e órgãos ambientais federais, estaduais e municipais.
No fim da semana passada, capitaneados pelo ISA (Instituto
Socioambiental), eles iniciaram uma campanha de envio de e-mails
ao governo, pedindo o veto ao artigo 64. Ontem uma carta foi
protocolada na Casa Civil (veja mais em www.socioambiental.org.br).
O secretário de Estado do Meio Ambiente de São
Paulo, José Goldemberg, enviou ao ministro José
Dirceu um fax no qual diz que o artigo é "um retrocesso"
porque ameaça a proteção de mananciais
de abastecimento público e a preservação
do pouco de mata atlântica que resta no litoral paulista.
O Ministério do Meio Ambiente encaminhou um parecer
técnico à Casa Civil justificando o pedido de
veto. Para João Paulo Capobianco, secretário
de Biodiversidade e Florestas, se isso não ocorrer,
as legislações ambientais estaduais e municipais
que se baseiam no Código Florestal vão perder
seu suporte legal.
O governo federal tem até o início do próximo
mês para sancionar o projeto de lei. Goldemberg e Capobianco
se dizem otimistas quanto à possibilidade do veto.
Um outro argumento contra o artigo 64 é que ele seria
inconstitucional porque não tem nenhuma relação
com o assunto de que trata o projeto de lei 47/2004.
Ele foi inserido como emenda de plenário no dia em
que o texto foi votado na Câmara dos Deputados por Ricardo
Izar (PTB-SP), coordenador da Frente Parlamentar de Habitação
e Desenvolvimento Urbano e relator da proposta --que versa
sobre tributação e crédito imobiliário
e vinha sendo discutida desde 1999.
Como não tratava de temas ambientais, o projeto não
foi acompanhado nem pelo Ministério do Meio Ambiente
nem pelas ONGs. Ambos ficaram sabendo da emenda apenas pelo
alerta de um promotor paulista, conta André Lima, advogado
do ISA.
A Folha tentou falar com Izar, mas ele está no Líbano,
em férias, segundo seu gabinete, que também
não conseguiu localizá-lo no hotel em que está
hospedado.
O Sinduscon-SP (Sindicato da Indústria da Construção
Civil do Estado de São Paulo) foi procurado, mas informou
que só vai se pronunciar sobre o projeto quando ele
for sancionado.
MARIANA VIVEIROS
da Folha de S.Paulo
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