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Num
ano repleto de interdições viárias em
razão do "canteiro de obras" montado pela
Prefeitura de São Paulo, os motoristas estão
com menos informações para se orientar no trânsito
paulistano e os dados oficiais dos congestionamentos chegam
a ser menores que a média de anos anteriores.
A explicação para esse cenário contraditório
não é nenhum milagre da engenharia de trânsito.
Ele se deve à redução de vias monitoradas
pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), ao corte
de funcionários responsáveis pela medição
dos engarrafamentos e à quebra de câmeras.
A CET se recusou, nos últimos três meses, a fornecer
dados que dimensionem essa situação. Mas um
balanço oficial da empresa revela que, somente de 2000
a 2002, caiu mais de 12% -de 545 km para 477 km- a extensão
de vias observadas por operadores de PAC (Posto Avançado
de Campo) -que, de binóculos, trabalham em cima de
edifícios monitorando a circulação e
transmitindo informações do trânsito.
Os PACs são a principal forma de a CET medir a lentidão
na capital paulista. Esses operadores passam os dados das
condições de tráfego à central
de operações, que registra tudo em um mapa e
faz a soma a cada 30 minutos.
Esse critério de aferição, adotado há
mais de dez anos, nunca teve a pretensão de atingir
os mais de 15 mil km de vias paulistanas. A área de
observação sempre esteve concentrada no centro
expandido. Mas, nos últimos quatro anos, até
alguns desses postos têm sido excluídos pela
empresa.
A quantidade de PACs ativados diariamente pela CET já
passou de 50 por período -manhã e tarde. Hoje
varia entre 30 e 35. Os funcionários nessa função,
que já beiraram 120, somam agora 87, dos quais nem
todos atuam sempre, já que eles também tiram
férias e sofrem remanejamentos.
Dentre os PACs desativados pela administração
Marta Suplicy (PT) estão alguns em áreas complicadas
de trânsito. Um deles, localizado num prédio
da avenida Angélica e que observava a rua da Consolação,
entre a rua Piauí e a av. Paulista, está sem
funcionar desde os últimos meses de 2003.
O posto de observação que ficava em cima do
edifício da Câmara Municipal, na região
central, também foi desativado neste ano.
Nas marginais Tietê e Pinheiros, onde já funcionaram
nove PACs no final dos anos 90, dois acabaram cortados de
lá para cá: a medição que era
feita nas pontes Vila Maria e Vila Guilherme não existe
mais, indicando uma redução de até 12
km na área observada.
É por esses motivos que os indicadores oficiais de
congestionamento da CET têm sofrido queda -embora a
frota paulistana receba mais de 400 veículos novos
por dia e as interdições viárias em trechos
críticos tenham aumentado, incluindo avenidas como
Rebouças, Cidade Jardim, Brigadeiro Faria Lima e Nove
de Julho.
História
A Folha recolheu dados da CET em uma semana de abril
de 2004 e identificou que a lentidão divulgada beirava
80 km nos picos da manhã e 120 km nos da tarde. A empresa
não divulga mais, desde março, as médias
de congestionamento de períodos anteriores.
Indicadores arquivados pela reportagem, entretanto, mostram
que esses números são inferiores aos de abril
de 2000 e 2001, por exemplo -de 81 km e 128 km e de 92 km
e 123 km, respectivamente.
As mudanças na medição dos engarrafamentos
não afetam apenas os dados oficiais e que ficarão
registrados na história da CET.
Elas interferem diretamente na vida dos motoristas que se
orientam pelas informações veiculadas em emissoras
de rádio ou pela internet. Esses paulistanos correm
sério risco de sair às ruas com tranqüilidade
e imaginar um trânsito "suportável"
ao saber que há "apenas" 172 km de lentidão
-a maior marca deste ano, registrada na quinta-feira passada.
Esse índice é bastante inferior aos recordes
históricos sempre divulgados pela CET: 242 km, em 28
de junho de 1996, e 239 km, em 2 de julho de 1999. Por trás
dessa "redução", entretanto, está
a queda de vias monitoradas, e não uma real melhoria
da fluidez.
O impacto negativo no trânsito é um tema que
incomoda representantes da prefeitura por causar desgaste
perante a classe média usuária de automóvel.
Em março deste ano, a prefeita Marta Suplicy chegou
a admitir publicamente uma piora no trânsito por conta
das obras viárias. As declarações foram
minimizadas nos dias seguintes, e, como nos meses anteriores,
a CET voltou a divulgar que as médias de lentidão
estavam em queda.
Câmeras
Além dos PACs, a CET costumava incluir nos
índices de lentidão informações
transmitidas pelas câmeras instaladas na capital paulista
e por marronzinhos.
Levantamento feito no mês passado, a pedido da Folha,
por um funcionário da empresa que não quer se
identificar para evitar represálias, apontava que 60%
das mais de 200 câmeras da CET estavam desativadas.
O diretor de operações da empresa, Irineu Gnecco
Filho, admitiu ontem, em entrevista ao "SPTV", da
TV Globo, que 50% delas estão sem funcionar, por não
haver contrato de manutenção e conserto dos
equipamentos.
As obras da Prefeitura de São Paulo também têm
interferido nos resultados finais de medição.
Com os bloqueios em vias importantes, os desvios não
são contemplados na observação.
Um exemplo é a rua Sampaio Vidal, uma das principais
rotas de desvio do trânsito da avenida Rebouças,
interditada no começo deste ano para a construção
de uma passagem subterrânea no cruzamento com a Faria
Lima.
Esse desvio não consta entre as vias relacionadas no
mapa da CET com algum tipo de lentidão nas últimas
semanas. Ou seja: um trecho da Rebouças fica oficialmente
sem trânsito por estar interditado; e a via para onde
os veículos foram desviados fica oficialmente sem trânsito
por não estar no campo de observação
do PAC.
ALENCAR IZIDORO
da Folha de S.Paulo
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