Alexandre
Órion flagrava como suas intervenções
se misturavam com as pessoas que passavam pela rua
Ao passar madrugadas desenhando centenas de caveiras em túneis
paulistanos, o artista plástico Alexandre Órion
descobriu um inusitado ingrediente para pintar quadros: a
fuligem liberada pelos automóveis, que fica aglomerada
em camadas negras nas paredes de cerâmica.
Aprendeu a fazer daquele pó ingrediente para uma tinta.
Essa tinta nasceu por acaso, quando Alexandre resolveu criar
uma obra, intitulada "Ossário", em um túnel
(o Max Feffer), na avenida Cidade Jardim. "A cor original
daquele túnel era o amarelo, mas, com o tempo, as paredes
ganharam um aspecto cinza até se tornarem completamente
negras."
Panos úmidos dão forma às caveiras amontoadas,
transmitindo a sensação de que os motoristas
estariam entrando em uma escavação arqueológica.
"Quis fazer dessa caverna urbana uma catacumba."
Foram semanas produzindo esse "ossário".
Os panos, imundos, eram levados para a sua casa e ficavam
num balde de água. Na manhã seguinte, parte
daquela fuligem estava separada no fundo. "Olhei para
aquilo e vi símbolos de uma cidade."
Veio, então, a idéia de pintar quadros com cenas
urbanas, transformando a fuligem em pigmento para a tinta.
Ele próprio sentia-se misturado a toda aquela fuligem.
"Quando voltava para casa, apesar de ter usado máscaras,
estava tonto e enjoado. Parecia que os banhos não me
limpavam."
O caos paulistano sempre envolveu todos os sentidos de Alexandre.
Nasceu e sempre morou em ruas movimentadas, com muito barulho
e poluição. "Os carros não paravam."
Adolescente, aventurou-se pelo grafite, preenchendo espaços
em viadutos e muros em torno das avenidas mais agitadas da
cidade. "São Paulo é, além de fonte
de inspiração, um ateliê e uma galeria
aberta."
Alexandre se destacou, porém, quando uniu desenhos
à fotografia, misturando fantasia e realidade na paisagem
paulistana.
Primeiro, fazia as intervenções nos muros e,
depois, flagrava como suas intervenções se misturavam
com as pessoas que passavam pela rua. Alexandre mostrou essa
obra inicialmente na Pinacoteca e, em seguida, rumou para
Nova York, São Francisco e Roterdã (Holanda).
O "Ossário" acabou ganhando vida. Incomoda
a intervenção macabra, tanto que a prefeitura
tratou de limpar melhor o túnel Max Feffer. Alexandre
procurou, então, outros túneis, mas percebeu
que aquelas caveiras já tinham cumprido sua missão
e tratou de experimentar a tinta à base de fuligem.
Notou que exibiam força na tela. Neste mês, uma
série de dez quadros nascidos daquela experiência
nos túneis vai para uma exposição.
"A cidade é minha matéria-prima",
conta, preocupado em transmitir, em suas intervenções,
as várias poluições urbanas.
PS - Separei algumas obras do artista plástico:
Foto
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Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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