Nessa
caminhada pela vocação, Sílvia está
prestes a voltar aonde começou; e, parte, graças
a crianças de rua
Sílvia Guimarães cursava desenho industrial
na Faap. Não demoraria a desconfiar de que a sua vocação
não passava por aquelas pranchetas. Em 1995, mudou-se
para Nova York e estudou fotografia. Mais uma frustração.
De volta ao Brasil, desorientada, não sabia qual caminho
seguir. Na busca angustiada de uma vocação,
lembrou-se do prazer que tivera ensinando a nadar. Ela disputava
torneios e acabou dando aulas. Imaginou que, talvez, estivesse
nas piscinas uma pista profissional.
"Quis ser professora." Fez pedagogia no Mackenzie
e, formada, trabalhou durante cinco anos numa pré-escola.
Mais uma insatisfação. "Não gosto
de ficar fechada nos espaços", conta, justificando
por que não queria ficar trancada num estúdio
de desenho industrial nem num laboratório fotográfico.
Optou pela aventura -literalmente. Como sempre gostou de exercícios
físicos, especialmente natação, resolveu
se especializar em esportes de aventura, percorrendo percursos
de até mil quilômetros a pé, de canoa
ou de bicicleta. Nessa caminhada pela vocação,
Sílvia está prestes a voltar aonde começou.
E, parte, graças a crianças também acostumadas
a fazerem caminhadas -crianças de rua.
Além de percorrer trilhas pelas mais diversas paisagens
brasileiras, Sílvia meteu-se em picadas por países
como o Vietnã, Quirquistão, Croácia,
Ilhas Fiji, Nova Zelândia, sem contar as cidades da
Europa e dos Estados Unidos. Começou como aluna, depois
competidora e tornou-se instrutora. "Meu prazer é
trabalhar numa sala de aula a céu aberto." Nos
longos trajetos, ela observava como as pessoas, submetidas
à extrema pressão, conseguiam se superar e aprendiam
a atuar em conjunto. "Eles precisavam trabalhar em equipe,
fazer planejamentos detalhados, valorizar o que os outros
têm de melhor e saber lidar com o pior.
Era uma espécie de viagem forçada de autoconhecimento."
Mas ficou especialmente impressionada quando teve de orientar,
no seu grupo, jovens em situação de risco, muitos
deles que perambularam durante muito pelas ruas -uma entidade
internacional bancava os custos das viagens. "Eles desenvolviam
o gosto pela autonomia."
Os jovens mudavam a postura do corpo, ficavam menos desinibidos,
abriam-se nas conversas, encantavam-se cada vez mais com as
paisagens. "Muitos descobriram, pela primeira vez, o
que significa contemplar, em silêncio, o pôr-do-sol."
Aos poucos, ela foi se dando conta de que o que aprendera
nas fechadas salas da faculdade de pedagogia ajudava a entender
a transformação naqueles desafiantes trajetos.
Ela resolveu, então, partir para mais uma aventura,
desta vez acadêmica. Vai voltar para a faculdade e cursar
mestrado em torno da pedagogia da aventura, mostrando como
se consegue provocar o prazer do aprendizado por meio dos
desafios da natureza. Agora, aos 31 anos de idade, já
não sente mais vontade de procurar nova profissão.
"Demorou, mas, enfim, encontrei meu caminho." O
de professora de aventura.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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