O Brasil consome, anualmente, cerca
de 6,5 milhões de toneladas de papel. Deste total,
quase a metade já é reciclada: três milhões
de toneladas. E são crescentes tanto o número
de indústrias que trabalham com a reciclagem, paralelamente
à produção tradicional, quanto as organizações
não-governamentais (ONGs) que realizam a reciclagem
junto com ações sociais.
A professora Thérèse Hofmann, da Universidade
de Brasília (UnB), decana de assuntos comunitários,
defende a aplicação de outras medidas ainda
antes da reciclagem, seguindo a política dos três
Rs, que significam primeiro reduzir o consumo, depois reutilizar
o material consumido e por fim criar consciência para
a reciclagem.
“Os governos devem contribuir na formação
desta cultura. Com a conscientização integrada
da população e do sistema público, o
retorno é imediato”, afirma a professora, que
aponta a falta de freqüência na coleta seletiva
de lixo como um dos problemas para a conscientização
da população.
Mas ela insiste que, antes de reciclar, sempre é possível
diminuir a quantidade de papel utilizado. “Quando surgiu
a internet e os computadores, houve uma idéia de que
tudo seria informatizado e o consumo de papel diminuiria.
Ao contrário, quadruplicou. As pessoas precisam se
habituar a imprimir nos dois lados do papel, por exemplo”,
explica Thérèse Hofman.
A professora lembra que diminuir o gasto de papel não
envolve apenas derrubar menos árvores: “É
preciso dimensionar todos os custos ambientais envolvidos,
como asfalto, combustível, água, energia e outros
bens necessários à produção de
papel.”
E, na hora de reciclar, Thérèse não
tem limites. Até guimbas de cigarro já se transformaram
em papel na UnB. A idéia foi do estudante de biologia
Marco Antônio Duarte e o projeto foi o início
de uma série de experiências com outros materiais
que podem ser convertidos em fibras de celulose, como filtros
de ar e refil dos repelentes utilizados em tomadas elétricas.
Outra experiência realizada pela UnB utilizou cédulas
de dinheiro. Em um convênio com o Banco Central, a universidade
recebe e recicla papel-moeda, que se transforma em papel comum.
Atualmente, a professora Thérèse estuda a possibilidade
de utilizar resíduos de colheita para a fabricação
de papel artesanal. “O foco do pensamento sobre cidadania
tem que estar na integração das ações.
Utilizar resíduos da colheita de soja pode contribuir
para aumentar a renda do agricultor”, observa.
Em termos de produção em escala industrial,
a Companhia Suzano foi a primeira a lançar no Brasil
um papel off-set 100% reciclado. O Reciclato existe desde
2001 e teve uma produção de mais de duas mil
toneladas nos três primeiros meses de 2004, o que significou
um crescimento de cerca de 200% em relação ao
primeiro trimestre do ano passado.
Produção
De acordo com a Associação Brasileira de Celulose
e Papel (Bracelpa), em 2003 a produção de papel
foi de 7,8 milhões de toneladas e o consumo interno
foi de 6,6 milhões. Mesmo assim, dados do Ministério
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio mostram
que, no mesmo ano, o país importou 578 mil toneladas
de pasta de celulose e papel.
Apesar de o consumo interno ser menor que a produção,
é necessário importar, porque se trata de tipos
diferentes de papel. Thérèse Hofman explica
que o produto brasileiro é feito a partir do eucalipto,
enquanto o europeu, por exemplo, vem do pínus. Esta
diferenciação resulta em papéis de qualidade
diferente, com variados níveis de resistência.
“O papel usado em trabalhos de restauração
é totalmente importado do Japão, porque é
uma fibra que tem excelência para isso”, analisa
a professora. O papel utilizado para a impressão de
jornais também é quase todo importado e nunca
reciclado. Isto porque a força das rotativas que imprimem
os jornais exige um papel de fibras longas e com grande resistência.
Assim, o Brasil importa papel, mas exporta o excedente produzido
e não consumido internamente, tendo ultrapassado a
marca de US$ 1 bilhão em 2003, ao exportar 1,777 milhões
de toneladas de papel e pasta de celulose.
Perspectivas de vida
Se a produção cresce é preciso também
pensar na reciclagem. Em São Paulo, a ONG RECICLAR
- Instituto de Reciclagem do Adolescente ensina jovens de
16 a 19 anos a trabalhar com reciclagem enquanto são
preparados para assumir o papel de cidadãos na sociedade.
A ONG trabalha com moradores da favela do Jaguaré,
na zona oeste da capital. Quem participa aprende a fazer objetos
com o papel reciclado e trabalha com registro em carteira,
recebendo um salário mínimo mensal para cumprir
uma jornada de 30 horas semanais.
Além da oportunidade de emprego, os adolescentes têm
acompanhamento escolar, aulas de arte e informática,
assistem a ciclos de palestras sobre profissão e visitam
exposições. Para participar do programa, só
há uma exigência: estar matriculado na escola
e freqüentar as aulas regularmente, com boas notas, bom
comportamento e interesse em aprender.
Ao todo, 95 jovens já passaram pelo RECICLAR desde
que ele foi fundado, em julho de 1995, pelo atual presidente
do Banco do Brasil, Cássio Casseb, juntamente com a
empresária Isabel Gianotti. Atualmente, 40 adolescentes
estão contratados.
Os jovens produzem artigos de papelaria, como folhas dos
tipos ofício e A4, envelopes, cadernos, risque-rabisque,
agendas, blocos, pastas, índices telefônicos
e cartões de visita, além de convites, cartões
de Natal personalizados e revestimento de objetos –
porta-retratos, porta-chaves, porta-lápis, álbuns.
Mensalmente, uma tonelada de papel doado por empresas parceiras
do projeto é reciclada pelos jovens do instituto. Este
volume corresponde ao produto de 15 a 20 árvores adultas,
de acordo com o gerente administrativo-financeiro do RECICLAR,
Paulo Roberto de Carvalho.
Aos 19 anos, com o ensino médio completo, os jovens
estão aptos a fazer papel artesanal, têm noções
de administração e estrutura psicológica
adequada para enfrentar desafios profissionais e ocupar seu
espaço na sociedade como cidadãos participativos.
Neste momento, a ONG auxilia no encontro de uma nova colocação
no mercado de trabalho, em parceria com departamentos de recursos
humanos de várias empresas.
Carvalho destaca três ex-participantes que são
um incentivo para a continuidade do projeto: Alda, Edmar e
Marcos Paulo, que passaram pelo RECICLAR e hoje cursam as
faculdades de psicologia, administração e turismo,
respectivamente.
“É bom ver que eles tomaram estes caminhos,
porque nós incentivamos muito a educação.
O curso de um deles, inclusive, está sendo pago por
um voluntário do instituto. O objetivo da ONG não
é só ensinar um ofício: a idéia
é que eles tenham aqui a experiência do primeiro
emprego”, afirma Carvalho.
Entusiasta do trabalho que realiza, Carvalho está
no RECICLAR há quatro anos e sempre faz o monitoramento
dos jovens que passaram pelo projeto. “Inclusive, eles
voltam depois de seis meses, para contar para os que ficaram
o que encontraram lá fora e como é o trabalho
em outras empresas”, orgulha-se.
As informações são
do site Fundação Banco do Brasil.
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