Há oito anos, o jornalista
e fotógrafo paulista Adail Moreira, 38 anos, descobriu
que sofria de ataxia espinocerebelar, uma doença genética
degenerativa, ainda incurável, que afeta o equilíbrio,
a coordenação motora fina, a fala e a visão.
Com dificuldades de fala e locomoção, Moreira
ficou quatro anos prostrado, até que decidiu fazer
rafting (ou canoagem) – e gostou. Sua necessidade de
andar com uma bengala ou de usar cadeira de rodas não
impediu que ele experimentasse outros esportes radicais. Foi
assim que ele se tornou um dos principais divulgadores do
turismo de aventura para deficientes físicos no Brasil.
No ano passado, ele fundou em São Paulo a ONG Aventura
Especial, cujo objetivo é promover a inclusão
dos portadores de necessidades especiais a partir dos esportes
de aventura adaptados. Pela internet, ele dá dicas
sobre lugares adaptados para receber esse público.
Segundo Moreira, que prefere ser chamado pelo apelido Dadá,
o esporte o fez recuperar sua auto-estima e os sintomas da
doença regrediram.
Cidadania-e: Como foi detectada a doença? E
o que mudou na sua vida?
Adail Moreira: Sempre pratiquei muito esporte. Caminhava
muito e comecei a ter dificuldade para andar em linha reta.
Detectei logo no começo, mas não adiantou muito
porque não há remédio para isso. No trabalho,
fiquei bastante abatido. Eu tinha assessoria de imprensa e
era fotógrafo freelancer para alguns jornais na cobertura
de eventos. Tinha meu estúdio, onde fazia fotos de
produtos para anúncios e catálogos. Mas comecei
a perder a fala e a coordenação motora. Fiquei
quatro anos prostrado, sem qualquer atividade.
Cidadania-e: O que o levou a ficar esse tempo parado?
Adail Moreira: Acho que é um processo meio natural.
Até então, eu podia fazer tudo. De repente,
me vejo com limitações para atividades básicas.
Falar e andar se tornou difícil. Quando você
passa a ter dificuldades como essas, acaba perdendo a auto-estima.
Cidadania-e: Como foi sua decisão de reagir?
Adail Moreira: Isso vai do estilo de vida de cada pessoa.
Hoje em dia, sei que todo mundo tem algum tipo de problema,
seja aparente ou não. O maior problema é o que
a gente tem na cabeça. Quando se tem um problema físico
e não se faz nada, um problema vira dois. Nesse período,
via aparecer de forma intensa o turismo de aventuras e me
perguntava por que eu não poderia participar disso.
Até que um dia resolvi fazer rafting. Pesquisei bastante
como era, liguei para várias agências, expliquei
minhas dificuldades. Mas entre o dia em que marquei e o dia
em que fui se passou um ano.
Cidadania-e: Por quê?
Adail Moreira: Eu estava com receio de atrapalhar os
outros. Resolvi primeiro me condicionar fisicamente. Afinal,
eu tinha ficado quatro anos sem fazer nada. No primeiro dia
em que fiz bicicleta ergométrica em casa, fiz 15 segundos.
Depois, mais 15. Até que fui fazer rafting e vi que
não era nenhum bicho-de-sete-cabeças. Muita
gente que estava lá deu mais trabalho que eu. Nunca
tinha feito e gostei. Aí, um amigo me chamou para fazer
escalada na academia. Fiquei um dia observando e resolvi fazer
também. Adaptando um pouco, dá para fazer. Gostei
tanto que hoje faço escalada diariamente em casa. Tenho
uma paredinha para praticar.
Cidadania-e: Quando o senhor percebeu que seu exemplo
poderia servir a outras pessoas com deficiência?
Adail Moreira: Como sou jornalista, pesquisei na internet
e vi que havia muitas pessoas que queriam fazer turismo de
aventura, mas não tinham informações.
Lancei um site para divulgar as informações
que serviram para mim. Escrevi, por exemplo, sobre como adaptar
o rafting. A repercussão foi muito grande. Aí
decidi saltar de pára-quedas. Parece um esporte radical,
mas o pára-quedista não precisa ter habilidade
física alguma. Basta ter coragem de saltar. Fui praticando
todos os esportes. Hoje, posso dizer que só não
saio correndo. O resto, faço tudo.
Cidadania-e: Que adaptações podem ser
feitas nos esportes radicais para pessoas com deficiência?
Adail Moreira: A deficiência não é
padrão. Cada um tem um tipo de dificuldade. É
preciso adequar de acordo com o caso. Dentro de alguns limites,
todo mundo pode fazer qualquer coisa. Entre os exemplos, está
o uso de roldanas para içar o praticante de rapel,
ter um instrutor acompanhando a caminhada ou permitir que
no rafting a pessoa se sente no chão, onde é
menor o desequilíbrio. Costumo dizer que o importante
não é a performance – se a pessoa vai
em corredeira de nível alto –, mas estar em contato
com a natureza e com os outros.
As informações são
da Fundação Banco do Brasil.
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