HOME | NOTÍCIAS | COLUNAS | SÓ SÃO PAULO | CIDADÃO JORNALISTA | QUEM SOMOS
 

entrevista
28/09/2004

Músico forma orquestra com crianças carentes

Em meio a ruas mal calçadas e ladeiras, em uma região conhecida como Grota do Surucucu, em São Francisco, Niterói, existe um local, à sombra de algumas árvores, onde a arte impera, transformando muitas vidas.

Em uma casa simples com um quintal acolhedor, a magia dos violinos, violoncelos, violas e flautas “tocou” a alma de adolescentes desta comunidade e despertou o interesse de vários jovens pelo mundo da música.

O responsável por esta iniciativa é o músico e professor Márcio Paes Selles, que criou, há dez anos, a Orquestra de Cordas da Grota do Surucucu.

No início, eram apenas quatro alunos que apostavam na arte como uma proposta de um futuro melhor; hoje, o projeto já conta com cerca de 100 jovens. Um grupo que se destaca pela extrema necessidade de expressão – fato que, talvez, possa ter gerado o convite para espetáculos até mesmo fora do país.

Como começou esse trabalho?
Tudo começou por causa da minha mãe que era professora e fazia um trabalho de reforço escolar com as crianças da Grota. Assim, comecei a dar aulas para os alunos da minha mãe.

Quem pode participar do projeto?
A orquestra está aberta para pessoas que realmente não têm condições financeiras. Nosso objetivo é proporcionar uma atividade que tire esses jovens de caminhos que não sejam apropriados. E todos os jovens devem estar matriculados na escola.

Qual a faixa etária dos jovens que integram a orquestra e a origem deles?
A maioria dos alunos tem entre 10 e 12 anos e moram aqui mesmo na Grota. Mas também trabalhamos com jovens das comunidades do Sapê, Atalaia, Largo da Batalha, Maceió, enfim, várias regiões menos favorecidas de Niterói. Diariamente, nos encontramos para os ensaios.

Quem trabalha com você ensinando aos jovens?
Além da minha esposa, Lenora, que também tem formação em música, tenho uma pequena equipe de alunos, formados aqui e que hoje dão as aulas.

Quem apóia esta iniciativa?
Atualmente, temos o apoio do BNDES e da Videofilmes, a produtora de Walter e João Moreira Salles, responsável por bolsas para 10 alunos da comunidade. A prefeitura de Niterói também é uma parceira de peso. Sempre nos insere em seus roteiros culturais, convidando-nos para apresentações, fornecendo lanche para estes músicos, entre outras coisas.

Com qual freqüência acontecem apresentações?
Mantemos uma média de três a quatro apresentações por mês. Geralmente, nas escolas, em salas de concerto, teatros e igrejas do Rio e Niterói.

A orquestra já se apresentou no exterior. Para onde foram e como surgiu o convite?
Fomos em 2001 para Portugal. Bem... o convite partiu de uma pessoa que nos assistiu em um espetáculo em um congresso. Levamos oito músicos para a Europa.

Qual a base do repertório do grupo?
Nossa base é a música barroca, mas posso dizer que somos muito ecléticos, fazendo arranjos para música popular brasileira, Beatles, etc.

Além das aulas de música, o que mais estes jovens aprendem?
Atualmente, temos um professor de pintura em tela. Já tivemos alguns resultados, mas confesso que todas as atividades que não são ligadas à música não vão para frente. Já tentamos implantar aqui, mais de uma vez, as aulas de inglês, mas não conseguimos dar continuidade.

Ah, vale citar o projeto do coral, formado por sete integrantes, chamado Negros e Vozes. Esses componentes cantam música africana e encontraram em sua própria iniciativa um meio de busca de identidade. Isso é muito legal. Partiu deles.

Posso perceber a ausência de mulheres na orquestra. O que acontece?
Acredito que as condições de vida aqui nestas comunidades não permite que as mulheres se dediquem a qualquer atividade que não sejam as tarefas de casa.

Mas isso não é um preconceito? Por que não incentivar as meninas a integrarem a orquestra?
Não é uma questão de falta de incentivo, mas de falta de estrutura para deixar a casa. A cultura aqui é: a mulher cuidar da casa, das crianças, dos irmãos, enfim.... Sei que é preconceituoso, sim, mas é a realidade atual e, claro, deve ser mudada.

Uma das curiosidades da orquestra é a presença de um luthier, pessoa responsável pela construção dos instrumentos de cordas. Isso ajudou a motivar os alunos?

Sem dúvida. O luthier Jonas Caldas já deu até aulas de produção de violinos. No entanto, essa construção exige um certo dom, habilidade mesmo. É muito difícil e, muitas vezes, isto desestimula o aluno. Mas Jonas, que é também professor do grupo, é quem nos socorre quando temos problemas com instrumentos.

Quais são as promessas para o projeto da Orquestra da Grota daqui pra frente?
A música é sempre um desafio. Você se alimenta disso e vai conquistando aos poucos o aprendizado. Às vezes, até ficamos deprimidos, com um vazio. O segredo é estudar sempre e com dedicação.

Além da Orquestra de Cordas da Grota, em que outras frentes você está envolvido?
Faço parte do grupo de música antiga – medieval e renascentista – Longa Florata, e também integro o grupo de Música Antiga da UFF. Além disso, também coordeno o Projeto Aprendiz – Música nas Escolas, uma parceria das Secretarias de Educação e de Cultura, que atinge cerca de duas mil crianças de nove escolas municipais de Niterói. Acho interessante citar também a Reciclarte. Bem... este foi o nome dado a ONG que tivemos que fundar, em 2001, para facilitar nossa captação de apoios, realizar esta parte burocrática que envolve patrocínios, participação em concursos, etc. Também sou professor dos corais da Escola Nossa, do Colégio
Itapuca e da Casa do Homem de Amanhã.


As informações são do site Fundação Gol de Letra.

 
 
 

NOTÍCIAS ANTERIORES
27/09/2004 Programa Livro Falado capacita voluntários para serem leitores
27/09/2004
Projeto oferece workshop de VJ a jovens de baixa renda no Rio de Janeiro
27/09/2004
Jovens quebram estereótipo de 'alienados'
27/09/2004 Centro Assistencial oferece atendimento gratuito a gestantes em SP
24/09/2004 Odontologia voluntária promete crescer
24/09/2004
Jornalista difunde esporte radical para deficientes
24/09/2004
Sociedade quer deficiência na pauta do poder público
23/09/2004
Mulheres usam o grafite para transmitir mensagens à comunidade
23/09/2004
Jovens em situação de risco aprendem química na cozinha
22/09/2004
Comunidade da Urca refloresta morro e combate incêndios