A movimentação
lhe dá vontade de realizar, em SP, o projeto que a
levou para Harvard -desenhar cidades
Por morar em Nova York e em São Paulo, a arquiteta
Anna Julia Dietzsch vive uma crise de identidade espacial.
Sente-se ao mesmo tempo em casa e deslocada nessas duas cidades;
muitas vezes se sente apenas uma habitante do mundo. Aprendeu
a ver com olhos estrangeiros tanto São Paulo, onde
foi criada e se formou na USP, quanto Nova York, onde mora
há 12 anos e trabalha em um dos mais renomados escritórios
de arquitetura.
Nessa ponte aérea, deixou sua marca em dois escombros.
Participou da construção do museu do World Trade
Center, criado para lembrar o atentado terrorista, e ajudou
a desenhar, em São Paulo, a praça Victor Civita,
erguida num terreno contaminado e transformada numa espécie
de museu da sustentabilidade.
Nesse trajeto, está redesenhando uma nova cidade, feita
da combinação de São Paulo e Nova York.
"O que há em comum é uma extraordinária
energia."
Quando menina, Anna adorava brincar de esconde-esconde na
rua (ainda de terra) no Alto de Pinheiros. Sempre estudou
por ali: Vera Cruz, Santa Cruz e, enfim, a FAU.
Resolveu, então, fazer mestrado em planejamento urbano
em Harvard.
"Meu projeto era desenhar cidades."
Acabou contratada pela DBB Aedas, responsável, por
exemplo, por obras do porte da reforma da Universidade Columbia
e da biblioteca pública, na Quinta Avenida. Em Nova
York, aprendeu o prazer de andar a pé e ter quase tudo
ao lado.
Durante certo período, morou na vizinhança do
Lincoln Center, com suas peças de teatro, concertos,
óperas e balé. "Andar a pé fazia
de Nova York, muitas vezes, uma cidade de interior."
Nas vezes em que voltava para o Brasil, via São Paulo
se afundar cada vez mais no caos, sem calçadas decentes.
"É uma cidade ostensivamente feia. Isso dói
para qualquer um, ainda mais para um arquiteto."
No final do ano passado, a DBB Aedas, animada com o crescimento
imobiliário brasileiro, abriu um escritório
no Itaim Bibi, entregando-o para Anna, que passou a viver
entre as duas cidades. Pôde então sentir mais
São Paulo. Prestou mais atenção nos efeitos
da proibição da propaganda de rua e até
começou a se sentir menos insegura nas ruas.
"Mas o que impressiona é a vitalidade." Nesta
semana, por exemplo, ocorrem simultaneamente a São
Paulo Fashion Week e o Campus Party, além das centenas
de comemorações dedicadas ao aniversário
da cidade.
A movimentação lhe dá vontade de realizar,
em São Paulo, o projeto que a levou para Harvard -desenhar
cidades. "Gostaria muito de integrar a periferia."
Não sabe quando isso será possível.
Mas, em sua crise espacial, sabe que essa tarefa é
bem mais estimulante no Brasil do que em Nova York, com suas
plácidas calçadas -justamente por isso, está
envolvida num projeto para a favela da Rocinha, no Rio.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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