O Brasil
está no primeiro mundo na reciclagem de lixo, chegando
a quase 89% de reaproveitamento das latas de alumínio,
mas a consciência ecológica ainda está
longe de atingir os níveis dos países desenvolvidos,
segundo os dados reunidos pelo IBGE nos “Indicadores
de desenvolvimento sustentável”, divulgados ontem.
A pesquisa expõe a distância entre a reciclagem
e a coleta seletiva de lixo. Enquanto a quase totalidade das
latas de alumínio é reciclada, apenas 1,9% do
lixo é coletado de forma seletiva. O IBGE, na publicação,
relaciona o alto índice de reciclagem à pobreza
e ao desemprego no Brasil:
"A situação não é tão
confortável como os dados parecem indicar. Esse índice
alto reflete, em parte, a miséria no qual uma parcela
da população brasileira vive", afirma Judicael
Clevelário Júnior, coordenador dos indicadores
ambientais da pesquisa.
Segundo o técnico do instituto, o Brasil não
repete o padrão observado no Japão e na Europa,
onde há separação do lixo e coleta seletiva,
práticas que sustentam a reciclagem. No Brasil, apenas
451 cidades recolhem o lixo separadamente, o que representa
apenas 8,2% do total de municípios. Na parcela de residências,
o percentual não chega a dois dígitos: são
apenas 6%.
"Se a economia melhorar e esse exército de catadores
conseguir emprego, esse índice de reciclagem pode baixar",
avisa Clevelário.
Garrafas pet
Na outra ponta, os percentuais de material reciclado só
fazem subir. Em 1993, 50% das latas eram reaproveitadas, no
ano passado, a taxa já alcançou 89%. O preço
mais compensador (R$ 4,40 por quilo) faz esse produto ostentar
a taxa mais alta. Já as garrafas pet, ainda de baixo
valor de mercado, alcança 35%, a menor na comparação
com o vidro (42%), latas de aço (49,5%) e papel (43,9%):
" Se houver uma taxação mais forte do pet
na saída da fábrica, a empresa será pressionada
a recolher o plástico. O ganho será ambiental
e de imagem", afirma o técnico.
Wanderson Soares da Silva, coordenador do projeto Reciclar,
que funciona na Igreja São Sebastião, em Olaria,
concorda com o Clevelário. A cooperativa reúne
890 catadores que trocam as latas, vidro, papelão e
plástico por cestas básicas:
"Acabou o emprego e só sobrou revirar o lixo
para gerar alguma renda. Não está ligado à
consciência ecológica. Mas, se essa população
conseguir emprego, larga o lixo".
Sonia Regina da Conceição Santana há
quatro anos vive do lixo. Trabalhava como costureira quando
a confecção fechou. Com a mãe doente
e sem emprego partiu para catar qualquer tipo de lixo em busca
das cestas básicas oferecidas pelo projeto. Ela passou,
então, a separar o material recolhido e, hoje, tem
um emprego no projeto, no qual ganha R$ 480 por mês.
"Acabei gostando da reciclagem. Acho que não
largo o emprego. Ainda recolho latas de amigos para trocar
por cestas básicas", afirma.
Vera Chevalier, da ONG Ecomarapendi, que já estimulou
a criação de 72 cooperativas de reciclagem que
reúnem cerca de 1.500, não vê risco de
a atividade perder força:
"Mesmo sem a coleta seletiva patrocinada pelo poder
público, a sociedade começa a se organizar e
separar o lixo".
CÁSSIA ALMEIDA
do jornal O Globo
|