Na mais
dura derrota do governo Lula numa votação no
Congresso, o Senado rejeitou ontem a medida provisória
que desde 20 de fevereiro proibia o funcionamento dos bingos
no país. “Agora liberou geral a jogatina”,
protestou o senador Tião Viana, do PT do Acre, admitindo
que o lobby dos donos de bingo tinha vencido. Foram decisivos
para a derrota do governo, porém, a desarticulação
da base governista e o racha no PMDB.
A medida provisória foi arquivada numa votação
apertada: foram 31 votos favoráveis ao texto e 32 contra
a legitimidade de se usar uma MP para o assunto, entre os
quais cinco do PMDB, partido da base governista. Nas galerias
do plenário e do lado de fora do Congresso, funcionários
dos bingos fizeram barulhenta comemoração logo
após o resultado da votação. As casas
de bingo estão liberadas para reabrir desde ontem à
noite.
Os manifestantes passaram a sessão xingando senadores
governistas que defendiam a aprovação da MP.
Usando camisetas com a inscrição “Devolvam
nossos empregos”, 60 pessoas saíram no Congresso
acenando o V de vitória para os senadores. Derrotados,
os governistas disseram que os senadores que votaram contra
estavam a favor do jogo do bicho e da contravenção.
"Decidir pela reabertura dos bingos é uma incoerência
e uma irresponsabilidade total. Esta foi uma decisão
da oposição que ela terá que assumir
perante a sociedade ", disse Tião Viana.
Derrota Calculada
Antes da votação, a oposição
tentou aprovar uma emenda do senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO)
que regulamentaria o funcionamento dos bingos com cartelas
e proibiria as máquinas e os caça-níqueis.
A decisão do governo de não aceitar o acordo
foi tomada pelo ministro da Coordenação Política,
Aldo Rebelo. Ele disse à líder do PT no Senado,
Ideli Salvatti (SC), que não poderia dar seu aval sem
antes ter certeza de que a proposta seria mantida pela Câmara.
"É uma temeridade, por causa do acirramento das
relações entre a Câmara e o Senado, eu
dar uma posição sem conversar com o João
Paulo (Cunha, presidente da Câmara)". disse Aldo
a Ideli, por telefone.
O líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), aprovou a opção
do governo de não fazer um acordo. Segundo ele, seria
uma contradição permitir a abertura dos bingos
depois da edição de uma medida provisória
que os fechou. Renan preferiu não comentar o significado
do resultado para o governo nem se o placar era uma demonstração
da fragilidade da base parlamentar aliada no Senado. Os cinco
do PMDB que votaram contra a MP foram Gilberto Mestrinho (AM),
Mão Santa (PI), Papaléo Paes (AP), Leomar Quintanilha
(TO) e Sérgio Cabral (RJ), que se absteve, mas retificou
o voto, ficando contra o governo.
"A base não é problema meu. O PMDB fez
o possível. Apelei à bancada. Os que me seguem
fizeram a reversão do voto e me comunicaram. Foi uma
decisão sábia do governo, uma derrota calculada",
avaliou Renan.
O Brasil sai perdendo
O clima ficou tenso, às 16h30m, logo depois
da leitura do parecer à medida provisória pelo
relator, Maguito Vilela (PMDB-GO). Quebrando uma tradição
da casa, nenhum parlamentar se manifestou em relação
ao mérito da MP. Quando o presidente José Sarney
(PMDB-AP) se preparava para dar como aprovada a relevância
e urgência da matéria, o senador José
Jorge (PFL-PE) pediu a contagem nominal dos votos. Já
que a votação havia começado, os governistas
não tiveram como mudar a situação.
Ideli e a senadora Heloísa Helena (sem partido-AL)
bateram boca. Heloísa insistia que o governo não
poderia pedir urgência para a MP porque ignorou o apelo
da oposição para que fossem indicados nomes
para a CPI do caso Waldomiro Diniz. Ideli argumentou que,
uma vez aprovada a MP, o governo já teria pronta nova
legislação para regular o jogo no país.
Nas galerias, uma centena de empregados e pessoas ligadas
ao jogo torciam para derrubar o projeto do governo e xingavam
a líder do PT.
Ideli disse que o país perdeu com a rejeição
da MP porque a maioria da opinião pública é
favorável ao fechamento dos bingos:
"Não considero uma derrota política. É
uma derrota para o país".
O líder do PFL, José Agripino Maia (RN), que
defendeu o acordo, criticou a atitude do governo:
"O PFL desde o início queria defender o emprego.
Mas o governo não quis negociar".
A senadora Roseana Sarney (PFL-MA), uma das articuladoras
do governo em outras votações, desta vez não
ajudou: se absteve, alegando que acompanhava o partido. Outros
senadores ligados a Sarney ficaram contra o projeto, como
Edison Lobão (PFL-MA) e João Alberto (PMDB-MA).
Na hora da votação, nove senadores deixaram
o plenário, inclusive Antonio Carlos Magalhães
(PFL-BA), outro aliado eventual do governo. Além de
Mercadante, outros petistas não foram ao senado ontem:
Cristovam Buarque (DF), Flávio Arns (PR) Ana Júlia
Carepa (PA), além do também governista Marcelo
Crivella (PL-RJ).
VALDEREZ CAETANO
LYDIA MEDEIROS
do jornal O Globo
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