O governo federal concluiu um
projeto de política nacional de cotas para permitir
o maior acesso de negros às universidades públicas.
A idéia é aprovar no vestibular uma parcela
dos afrodescendentes que conseguirem alcançar uma determinada
nota mínima. Pelo projeto, cada universidade determinaria
que porcentual destes candidatos seriam aprovados. Alguns
não-negros com notas maiores seriam reprovados.
Elaborado por um grupo de trabalho que reúne representantes
de 11 ministérios, do Conselho Nacional de Educação
(CNE) e da Advocacia Geral da União (AGU), o texto
deve ser apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula
da Silva até o dia 17. O coordenador do grupo, João
Carlos Nogueira, considera "inevitável" que
alunos não negros com notas maiores sejam preteridos.
"Uma política de ações afirmativas
tem de enfrentar uma estrutura que permite a desigualdade",
afirmou.
"A idéia da proposta é que, em vez de
tornar disponíveis 100 vagas, por exemplo, que fatalmente
seriam ocupadas por alunos brancos, 80 estariam à disposição
dos estudantes. Os brancos competiriam por menos vagas",
explicou Nogueira, que é subsecretário institucional
da Secretaria Especial de Políticas de Promoção
e de Igualdade Racial.
Nota de corte
A maioria das universidades públicas estipula antes
mesmo do vestibular qual nota mínima – a nota
de corte - o candidato deve atingir para que seja considerado
apto a acompanhar o curso. Mas nem todos os que chegam a essa
marca obtêm uma vaga. Como o número de vagas
nas escolas públicas é sempre menor que o número
de candidatos, só são aprovados aqueles que
estão bem acima desse mínimo.
"Os alunos negros que passam da linha de corte têm
toda a capacidade, só não conseguiram atingir
os que obtiveram as maiores notas", justificou Nogueira.
Se aprovada pelo governo, a proposta terá caráter
autorizatório e não de uma regulamentação,
porqu eisso feriria a autonomia universitária. Segundo
Nogueira, a nova política atingiria mais diretamente
as universidades federais. "O governo pode ter mais gerência
sobre as federais, mas a idéia é que seja um
processo combinado com as instituições."
As que aderirem ao projeto teriam apoio do MEC.
Unifesp, Uerj e Uneb
Se a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) tivesse
adotado o sistema de cotas por nota mínima no vestibular
do ano passado, muitos afrodescendentes teriam sido aprovados.
Um estudo inédito da instituição mostrou
que a diferença na pontuação entre negros
e não-negros foi muito pequena. Com uma cota de 20%
das vagas, "o último vestibulando negro que entrasse
teria uma nota somente 5% inferior à do último
candidato que realmente foi aprovado no nosso vestibular",
relatou Lucia de Oliveira Sampaio, assessora da pró-reitoria
de Graduação.
A Unifesp, uma das mais disputadas instituições
de ensino da área de saúde, oferece cinco cursos
e tem 273 alunos. Desses, somente 18 (ou 6,5%) se declararam
pardos, mulatos ou pretos, segundo o critério da autodeclaração.
Lúcia avalia que a proposta do governo é razoável
e permitiria que os alunos beneficiados tivessem condições
de acompanhar o curso sem problemas. "Os alunos que vêm
para a Unifesp são muito qualificados. A maioria fala
inglês, conhece informática e já faz pesquisa",
disse.
Duas universidades públicas brasileiras já
têm políticas próprias de acesso para
negros: a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e
a Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Em 2004, a Universidade
de Brasília (UnB) e a Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul (Uems) passarão a adotar a reserva de
vagas.
MARCOS DE MOURA E SOUZA
da Agência Estado
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