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política
27/01/2004
Cristovam ataca 'primeiro ministro'

O ex-ministro da Educação Cristovam Buarque atacou ontem o chefe da Casa Civil, José Dirceu, por centralizar excessivamente as decisões de governo. Com uma relação desgastada com o ex-colega praticamente desde o início do governo, Cristovam revelou ontem que muitos projetos seus pararam no Planalto. Um desses projetos, a eleição direta para reitores das universidades federais, chegou a ser vetado, apesar de ser uma antiga bandeira do partido.

Cristovam não poupou ironias ao se referir a Dirceu, embora não tenha citado seu nome uma única vez. Ao ouvir que o chefe da Casa Civil estava cumprindo uma agenda de presidente, reunindo-se com vários ministros, comentou:

"Não acredito. Ninguém tem dúvidas de que o presidente é Lula. Digamos que ele é, no máximo, um primeiro-ministro", ironizou.

Cristovam não quis afirmar que havia má vontade da Casa Civil em relação aos seus projetos, mas disse acreditar que havia “um certo acomodamento, um medo de incomodar”. Reclamou, por exemplo, de terem alegado que alguns de seus projetos dependiam de mudanças na Constituição.

"Ora, se é preciso reformar a Constituição, reforma-se a Constituição. Se a gente reformou para tirar direitos de velhinhos também pode reformar para dar direito a criancinhas e escolas", afirmou.

Piada
Ao falar dos projetos que não passaram pelo crivo do Planalto, Cristovam comentou:

"Pelo jeito, eu devo ter tido menos paciência, menos dedicação ou insistência. O fato é que grande parte das propostas que fiz e formalizei, paravam", disse ele.

O chefe da Casa Civil não comentou as declarações, mas fez piada com o título de primeiro-ministro.

"Diz que sou primeiro-ministro? Assim o presidente vai me demitir lá da Índia", brincou Dirceu.

Desde o início do ano, cerca de 15 projetos enviados à Casa Civil pararam ali. Vão desde a obrigatoriedade do ensino médio até a criação do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico. As justificativas para a lentidão são várias, mas uma delas mostra nova faceta do governo. A eleição direta para reitores das universidades foi vetada porque “poderia diminuir a interferência do presidente na nomeação dos dirigentes das instituições federais de ensino superior”.

O texto é de um relatório da Casa Civil, com a análise das propostas do Ministério da Educação. Hoje, a comunidade universitária faz uma eleição e os três mais votados vão para uma lista. Daí o presidente e o ministro da Educação escolhem o novo reitor, não necessariamente o mais votado. O PT sempre foi contrário a essa prática e Cristovam prometeu que a mudaria. Lula decidiu não levar adiante o projeto por instrução da Casa Civil, que fez a avaliação do risco.

“Ênfase é na economia”
Outro pleito negado é exatamente o contrário do pregado pelo PT. Em setembro deste ano, o ministro enviou um pedido à Casa Civil para que os vetos feitos pelo ex-presidente Fernando Henrique ao Plano Nacional de Educação — entre eles a obrigatoriedade de se investir 7% do PIB na educação até 2007 — fossem derrubados, posição que o partido sempre defendeu na oposição.

A subchefia de Ação Governamental da Casa Civil chegou a dar parecer favorável. No entanto, o Ministério da Fazenda mandou um aviso no dia 21 de novembro pedindo que a bancada governista fosse orientada a manter os vetos. No mesmo relatório, a Casa Civil informa que, extra-oficialmente, o Planejamento também pretendia impedir a derrubada dos vetos.

Uma das queixas do ministro é de que alguns dos seus projetos tinham já dotação orçamentária, mas foram negados por acarretar impacto financeiro, com pareceres contrários da Fazenda e do Planejamento. Um deles é a Poupança Escola, em que estudantes do ensino médio receberiam uma poupança de R$ 240 por série completada e poderiam retirar o dinheiro quando terminassem o curso. Há recursos previstos no orçamento do MEC e no Plano Plurianual, mas foi vetado.

Outro programa está em suspenso pelo argumento de que começaria com apenas dez mil pessoas. É o Programa de Apoio ao Estudante do Ensino Superior, em que o governo daria bolsas de estudos para alunos comprovadamente carentes, que teriam poucas condições de pagar o crédito educativo, desde que fizessem cursos de licenciatura.

O projeto de lei está pronto, com pareceres favoráveis da Fazenda e do Planejamento, mas a Casa Civil pôs em dúvida a validade de começar com dez mil bolsas. O MEC pretendia iniciá-lo com 30 mil, mas aceitou dez mil pelas restrições orçamentárias existentes. Em 25 de novembro técnicos da Casa Civil informaram que iriam consultar o presidente, mas ainda não houve resposta.

"Lutei para que toda a criança tivesse vaga na escola quando fizesse 4 anos. Isso está no programa de governo, mas o projeto foi e voltou. Que o ensino médio fosse obrigatório, foi e voltou, para aumentá-lo para quatro anos, foi e voltou. Foi fruto de eu não ter tido ou a competência ou a dedicação necessária para fazer fluir", disse Cristovam. "O problema é que o governo tem dado tanta ênfase à economia que o social fica relegado. Em uma reunião, disse ao presidente que um dos problemas que faziam o social aparecer pouco é que o presidente falava pouco no social".


LISANDRA PARAGUASSÚ
do jornal O Globo

   
 
 
 

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