O modo como a comunidade trabalha
para mudar a situação de bairros carentes, pressionando
o governo a agir e participando dessa ação,
é decisivo para a transformação desses
locais, segundo representantes de organizações
voltadas para a melhoria da qualidade de vida em favelas.
Eles foram ontem ao Jardim da Conquista, na zona leste. "Visito
favelas em muitos lugares do mundo e o que percebo é
que, quando a comunidade se movimenta, os governos começam
a agir também", disse Ruth McLeod, integrante
da Homeless International, uma espécie de associação
internacional de sem-teto.
A atividade fazia parte da Conferência
Internacional Cidades Contra a Pobreza Urbana, organizada
pela Cities Alliance, que reúne países preocupados
com a recuperação de áreas de habitação.
Entidades de todo o mundo visitaram locais onde a Prefeitura
tem projetos de intervenção urbana.
Foram escolhidos o Jardim da Conquista,
Heliópolis e Vila Nova Esperança, atendidos
pelo programa Bairro Legal, para urbanização
de favelas, e o Edifício Rizkallah Jorge e o Casarão
Belém, incluídos no Morar no Centro.
No Jardim da Conquista, os visitantes
se impressionaram com a organização dos moradores,
que, desde o início da ocupação, em 1990,
formaram uma associação para pressionar a Prefeitura
e conseguir água, luz e saneamento.
Tudo aconteceu aos poucos. Em outubro
de 2002, como parte do Bairro Legal, começou o trabalho
de pavimentação.
Uma comissão formada por 359
pessoas acompanha os trabalhos. A previsão é
que tenham sido asfaltados 30 quilômetros de ruas, finalizados
muros de arrimo, escadas e serviço de drenagem em janeiro
de 2004. Até lá, serão consumidos R$
12,5 milhões, financiados pelo Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID).
O próximo passo será
a regularização dos lotes, que deve ser iniciada
no ano que vem, segundo informações da Secretaria
Municipal de Habitação. "Nunca consideramos
este lugar uma favela. Agora só falta o documento de
posse", disse o vice-presidente da associação
de moradores, Laércio José de Souza.
Piscina - O carpinteiro Antônio
Inácio da Silva, de 69 anos, só não perdeu
móveis nas chuvas de verão do ano passado porque
mora num lugar alto. Muitas vezes viu vizinhos tendo prejuízos
cada vez que chovia. "Aqui em frente virava uma piscina",
lembra. "Com o asfalto está ótimo."
Silva é nordestino, de Natal,
como 90% dos 40 mil moradores do bairro. A dona de casa Maria
dos Anjos de Assis também. Pernambucana, mora no Jardim
da Conquista, com o marido e as duas filhas. Ela já
gostava do bairro antes das melhorias, mas não tem
saudade do tempo em que a poeira ou o barro tomavam conta
de tudo. "A casa não parava limpa."
Conselheiro de Melhorias Urbanas da
Cities Alliance, Willian Cobbet acredita que o empenho da
população é a chave para a solução
de problemas. "Ouvindo o relato dos líderes das
comunidades percebe-se que o recurso mais importante são
as pessoas, que fazem tudo que o governo e os bancos não
podem fazer."
Serviços simples, mas importantes
para os moradores, foram assumidos pela associação,
como a distribuição de refeições
para pessoas de menor renda.
Calcula-se que metade dos moradores
do Jardim da Conquista ganha até três salários
mínimos. Parte deles, às terças e sextas-feiras,
passa na sede da associação e pega uma porção
de sopa, feita com ingredientes arrecadados.
A dona de casa Áurea
Rodrigues Ribeiro, de 53 anos, é uma das quatro cozinheiras
que preparam a refeição. "Às vezes,
essa comida vai alimentar toda a família", afirma.
A cada dia de distribuição de sopa, cerca de
700 pessoas vão à sede da entidade.
Marina Pauliquevis
O Estado de S. Paulo
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