Por volta das 13 horas, o trânsito
pára inesperadamente na entrada da Rua Conselheiro
Ramalho, na Bela Vista. Motoristas impacientes buzinam, gesticulam.
Diante deles, um pequeno caminhão acende o pisca-alerta
e os funcionários, como se estivessem parados num estacionamento,
começam a descarregar botijões de gás
que serão entregues ao longo da rua. É o bastante
para formar uma fila de carros que vai congestionar ainda
parte da Avenida Brigadeiro Luís Antônio por
pelo menos 20 minutos.
Cenas como essa se repetem de norte
a sul da cidade. Várias delas foram flagradas nos últimos
dias. Os caminhoneiros, mesmo com a possibilidade de levar
multa de R$ 127,69 e perder 5 pontos no prontuário
do condutor, conforme o Código de Trânsito Brasileiro,
acabam desrespeitando a lei, que proíbe parar e estacionar
em fila dupla, e travando o trânsito em vias movimentadas.
Desde junho, a Prefeitura regulamentou
a entrada de caminhões nas chamadas Zonas de Máxima
Restrição de Circulação (ZMRCs),
que englobam, por exemplo, os Jardins, onde antes só
podiam circular de madrugada. Nessas áreas, o motorista
precisa de autorização para circular, com o
cartão-caminhão. "É um absurdo.
O trânsito já é caótico e os motoristas
de caminhão de carga e descarga não respeitam
as leis", reclama o taxista Juvenal Mendes.
Não bastasse a costumeira confusão
no trânsito na Rua 25 de Março, no centro, um
caminhão descarregando telhas, em fila dupla, impedia
a passagem de carros, na sexta-feira.
No tráfego já complicado
da Avenida Santo Amaro na segunda-feira um caminhão
fazia entrega de bebidas, ocupando uma das duas faixas da
pista. "Virou um funil", reclamou o vendedor Anísio
Marques. Ainda na segunda-feira, um episódio não
muito raro na Alameda Vicente Pinzón, na Vila Olímpia:
caminhões formaram uma fila tripla na rua.
A Companhia de Engenharia de Tráfego
(CET) não tem em separado o número de multas
dadas a caminhões parados em fila dupla, mas, só
de janeiro a setembro, registrou 11.348 infrações
desse tipo envolvendo todos os tipos de veículos na
capital. Um estudo da CET de 1997 aponta que apenas 6% dessas
irregularidades são cometidas por caminhões,
contra 70% dos carros.
Para o presidente da Associação
Brasileira de Caminhoneiros (Abcam), José da Fonseca
Lopes, os motoristas infringem a lei por conta da escassez
de vagas para estacionar e pela falta de política para
a circulação de mercadorias.
"O caminhoneiro chega a ficar
até seis horas esperando uma vaga", diz. Lopes
critica também a falta de iniciativa dos empresários
para resolver o problema.
Fila dupla não é a única
infração que os motoristas acabam cometendo
na busca por uma vaga. Em toda a cidade, as placas de proibido
parar e estacionar são ignoradas. "Não
tem outro jeito. Ou fico irregular ou não descarrego.
As poucas vagas que existem são ocupadas por carros",
reclama o caminhoneiro José Pontes, que estava ontem
parado sob uma dessas placas, na Rua Padre Garcia Velho, em
Pinheiros, por volta das 15h30. "Estou rodando desde
as 7h30 para fazer 45 entregas."
Na Rua Belchior Coqueiro, no tumultuado
Largo da Batata, também em Pinheiros, o caminhoneiro
Francisco Cruz foi vaiado por motoristas enquanto descarregava
o caminhão em local proibido. "Não tem
vaga. Desculpa aí, gente", disse.
De acordo com o gerente de Planejamento
da CET, Ronaldo Tonobom, diariamente circulam na capital 200
mil caminhões para a entrega de mercadoria, mas esse
número poderia cair em até 50% se fosse aplicado
o estudo de mobilidade de bens de serviços, feito pela
companhia, em que se recomenda a entrega noturna. "Temos
dados que apontam redução no uso da frota em
até 80%."
Tonobom diz que a Prefeitura
enfrenta ainda outro problema: 40% dos caminhões que
circulam na cidade são de outros Estados. "Eles
querem fugir das multas." Com placa de Poços de
Caldas (MG), o caminhoneiro Pontes confirma. "Se minha
placa fosse de São Paulo, já teria perdido o
caminhão."
BÁRBARA
SOUZA
De O Estado de S. Paulo
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